Algumas dezenas de belas obras desses
dois irmãos podem ser admiradas até domingo no Museu Afro Brasil, em uma exposição simplesmente imperdível. Como não era
permitido fotografar, mesmo sem flash, tentei reunir algumas
imagens por meio de fotos da internet. Nem todas as obras que aqui estão fazem parte da exposição, mas já dá para a gente percorrer um pouco da
trajetória desses grandes artistas.
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Arthur Timótheo da Costa - 'Nu feminino' (s.d.) - óleo s/ tela - coleção particular |
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João Timótheo da Costa - 'Reflexos do sol em morro do Rio de Janeiro' (1909) - óleo s/ madeira |
Tudo começou quando os irmãos arrumaram emprego na Casa da Moeda do Rio de Janeiro e tornaram-se aprendizes de desenho de moedas e selos. Arthur também conheceu o processo de gravação de imagens. O diretor da instituição, uma alma iluminada chamada Enes de Souza, reconheceu o talento dos meninos, incentivando e patrocinando o ingresso de ambos na Escola Nacional de Belas Artes (ENBA) em 1894. Lá tiveram aulas de modelo vivo e desenho com Zeferino da Costa (1840-1915) e Rodolfo Amoedo (1857-1941), entre outros ótimos artistas.
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Arthur Timótheo da Costa - obra da exposição |
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Arthur Timótheo da Costa - obra da exposição |
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Arthur Timótheo da Costa - 'Autorretrato' (1908) óleo s/ tela - acervo da Pinacoteca de São Paulo |
Vamos falar primeiro de Arthur Timótheo que, embora fosse o irmão mais novo, teve morte mais precoce. Quando já estava cursando a ENBA ao lado de João, Arthur teve a felicidade de tornar-se aprendiz de cenografia com o italiano Oreste Coliva, famoso pelos cenários de óperas que havia criado em seu país natal e também em Buenos Aires, Montevidéu e, posteriormente, no Brasil.
Em 1905, Arthur estreou na Exposição
Geral de Belas Artes com duas pinturas, 'Diante do Modelo' e 'Repreensão',
mas o êxito veio apenas em 1907, quando ganhou como prêmio uma viagem ao
exterior com a tela 'Antes da Aleluia'. No ano seguinte, lá foi ele para Paris,
onde ficou dois anos antes de percorrer a Itália e a Espanha. Influenciado
pelos impressionistas e visivelmente impressionado com o pintor simbolista
francês Puvis de Chauvannes (1824-1898), Arthur passou a exibir em suas
obras, a partir de então, contornos menos rígidos e volumes modelados nas pinceladas.
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Arthur Timótheo da Costa - 'Antes da Aleluia' (1907) - óleo s/ tela - Museu Nacional de Belas Artes (RJ) |
Após retornar ao Brasil, em 1910, Arthur
criou uma das pinturas mais emblemáticas de suas tendências vanguardistas: 'A Forja' (1911), fortemente influenciada pelos
pintores europeus e cujos traços teriam antecipado a pintura do Modernismo - tanto
no tema, o trabalho industrial, quanto no tratamento da imagem, com a ausência
de contornos em vigorosas pinceladas. Infelizmente, não consegui nenhuma imagem
desta obra.
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Arthur Timótheo da Costa - foto da exposição |
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Arthur Timótheo da Costa - 'Modelo em repouso' (s.d.) - óleo s/ tela - SPHAN
Pró-Memória/Museu Nacional de Belas Artes (RJ) |
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Arthur Timótheo da Costa - 'Pintor no Ateliê, Paris, França' (c.1910) - óleo s/ tela - acervo Instituto Cultural Sérgio Fadel |
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Arthur Timótheo da Costa - 'A Dama de Verde' (1908) - óleo s/ tela - Museu de Arte de São Paulo - obra da exposição |
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Arthur Timótheo da Costa - 'Retrato de menino' (s.d.) - série Carnaval XXVIII - óleo s/ cartão Coleção particular |
Mesmo criando obras sob encomenda para as senhoras da alta burguesia, porém, Arthur não esqueceu suas raízes e nunca deixou de pintar sua gente, negros pobres e simples que ele retratou com uma técnica apurada e extrema beleza. A exposição do Museu Afro Brasil tem dois desses retratos, um deles de 1906.
Em 1910, Arthur rumou para a Itália
juntamente com seu irmão João e um grupo de artistas, para uma missão para lá
de especial: decorar o Pavilhão Brasileiro na Exposição Internacional de Turim,
que seria realizada no ano seguinte. Uma honra.
Em 1912, os dois irmãos voltaram para o
Rio e, a partir dali, Arthur expôs regularmente nas Exposições Gerais de Belas
Artes, conquistando medalhas nos anos de 1913, 1919 e 1920. De modo geral,
Arthur continuou pintando as belíssimas paisagens que tanto me encantaram na
exposição, bem como outros temas da pintura acadêmica, mas os traços do
impressionismo estavam lá. Em suas últimas paisagens eles ficaram ainda mais
evidentes, como é o caso de 'Cais Pharoux, Sol e Mercado Velho do Rio de
Janeiro' (1918), exposta na mostra. Nesta obra-prima, a dinâmica das
cores prevalece sobre a definição das figuras, com pinceladas mais marcadas e
movimentos mais velozes.
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Arthur Timótheo da costa - 'Bosque - Turim' (1911) - óleo s/ tela - Coleção Fernando Soares (São Paulo - SP) |
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Arthur Timótheo da Costa - 'Cais Pharoux' (1918) - óleo s/ madeira - Coleção Max Perlingeiro - obra da exposição |
Em 1919, Arthur fundou, ao lado de
outros artistas, a Sociedade Brasileira de Belas Artes no Rio de Janeiro. Pouco
depois, junto de João, fez a decoração do Salão Nobre do Fluminense Futebol
Clube. Após o falecimento de Arthur, em 1922, João continuou o trabalho até
1924.
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Este autorretrato de Arthur tem um primoroso trabalho de luz e sombra. |
Em 1921, Arthur participou pela última
vez da Exposição Geral de Belas Artes e, infelizmente, teve um fim trágico. Em
virtude de uma doença mental, foi pouco a pouco deixando de pintar e, internado
no Hospício dos Alienados do Rio de Janeiro, morreu nessa instituição em 1922.
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João Timótheo da Costa |
Agora vamos ao outro irmão. Embora João Timótheo tenha criado mais de 600 pinturas dos mais variados gêneros,
a exposição tem menos obras suas do que de Arthur, devido
à dificuldade de empréstimo de obras pertencentes a coleções particulares.
Achei suas paisagens particularmente belas e poéticas, mas, segundo o crítico José Roberto Teixeira Leite, João se
destacou mais nos nus masculinos e nos retratos, com um desenho sensível e um
belo colorido. O fato é que suas pinturas têm muitas afinidades com as
de seu irmão, tanto nos temas quanto na técnica. Com pinceladas largas, João
estrutura suas composições por meio da cor, trabalhando tanto com espátula
quanto com pincel. Seus quadros de paisagens, principalmente as marinhas,
apresentam uma luminosidade delicada e sutil.
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João Timótheo da Costa - 'Retrato' (1928) - óleo s/ tela Museu Nacional de Belas Artes (RJ) |
Quando viajou a Turim ao lado de Arthur, em 1910, contratado
pelo governo brasileiro para decorar o Pavilhão do Brasil na Exposição
Internacional, João aproveitou a oportunidade para visitar vários museus em
países europeus, notadamente Espanha (Barcelona) e Suíça. Desta forma, assim como
seu irmão, pode conhecer obras impressionistas e as pinturas do simbolista Puvis de Chavannes, que marcaram seu
trabalho de forma ainda mais profunda do que o de Arthur.
Muito requisitado para realizar
pinturas decorativas, João executou, em 1925, cinco painéis abobadados para o
Salão Nobre da Câmara dos Deputados, atual Assembleia Legislativa do Rio de
Janeiro. Até o hotel Copacabana Palace tem uma série de painéis decorativos de
sua autoria, executados no mesmo ano. Sim, os Guinle sabiam o que era bom!
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João Timótheo da Costa - 'Paisagem' (1912) - óleo s/ tela Museu Carlos Costa Pinto (Salvador, BA) |
A obra 'Barcos' (1920), abaixo, João mostra grande sensibilidade no uso da cor. Suas pinceladas sugerem volumes e distâncias, explorando o jogo entre as formas sólidas - os barcos - e os reflexos coloridos na água.
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João Timótheo da Costa - 'Barcos' (1920) |
Assim como seu irmão, João também
participou de diversas edições do Salão Nacional de Belas Artes, recebendo uma
medalha de outro em 1926. Em algumas obras, aproxima-se do enquadramento
fotográfico, como nos exemplos abaixo.
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João ´Timótheo da Costa - 'Recanto de Atelier (1926) - óleo s/ tela - Museu Nacional de Belas Artes (RJ) - obra da exposição |
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João Timótheo da Costa - Sem título (s.d.) - óleo s/ madeira Coleção Nelson Adoglio (São Paulo) |
João costumava reclamar do excesso de luz tropical,
dizendo que ela prejudicava sua pintura – o que não é de se admirar, visto que
tinha uma queda pela pintura mais sombria dos simbolistas. Na obra 'Nu Feminino', de nítida inspiração pontilhista, João adaptou a linguagem do francês Seurat à sensualidade tropical.
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João Timótheo da Costa - 'Nu Feminino' (1929) - obra da exposição |
Ironicamente, ambos os irmãos partilharam o mesmo triste destino: a insanidade mental de Arthur, falecido prematuramente em
1920, e a morte da filha de seis anos foram duros golpes dos quais João nunca
se recuperou totalmente. Assim, também adoeceu e, a exemplo de seu irmão, foi internado no Hospício dos Alienados em 1930, falecendo em 1932.
É impressionante como, mesmo tendo vidas breves – um morreu
prestes a completar 40 anos e o outro aos 52 -, os dois irmãos tenham
conseguido produzir tantas e tão belas obras. Só mesmo o talento para explicar uma
produção tão excepcional. É por isso que é difícil entender por que Arthur e
João Timótheo não são tão conhecidos, hoje, quanto outros grandes pintores brasileiros
do século XIX, como Almeida Junior ou Rodolfo Amoedo. Não duvido, inclusive, que o preconceito racial tenha tido grande parcela de responsabilidade nessa lamentável omissão.
Portanto, corra para o Museu Afro Brasil para conferir a exposição ‘DOIS IRMÃOS’!
Corra mesmo, porque domingo, dia 4/8, é o último dia. O museu fica à Av. Pedro
Álvares Cabral, s/n - Parque Ibirapuera - Portão 10. Tel.: 3320 8900 – www.museuafrobrasil.org.br. Das 10h às 17h - entrada franca.
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