segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Surpresa! Andrea Beltrão põe no chinelo várias cantoras nacionais.

A ideia até que era boa. Contar os percalços fictícios de uma jovem aspirante a atriz desprovida de qualquer talento na Portugal do século XVI. Este era o mote da comédia musical 'Jacinta', protagonizada por Andrea Beltrão, que esteve em cartaz no teatro do Sesc Vila Mariana até 22 de setembro. Ocorre que, para mim, e também para quem estava comigo, a peça deixou muito a desejar. De autoria de Newton Moreno, Aderbal Freire-Filho e Branco Mello, o espetáculo se perdeu num roteiro confuso, inúmeras situações absolutamente sem-graça e diálogos com sotaque lusitano que, muitas vezes, eram ininteligíveis. Sim, a gente com frequência não conseguia entender o que os atores diziam ou cantavam. Algumas cenas, sobretudo na segunda metade do espetáculo, podiam figurar tranquilamente no patético 'Zorra Total', dada a sem-gracice dos diálogos. Por essas e outras, a peça tornou-se arrastada e cansativa. Uma pena.

Andrea Beltrão em cena no musical 'Jacinta'.
Foto: www.entretenimento.uol.com.br

Mas não estou aqui para falar do musical, que já nem está mais em cartaz. Quero é fazer uma menção especial a Andrea Beltrão, que foi a boa surpresa da noite. Descobri ali que, além de excelente atriz, ela canta divinamente. Dona de uma voz belíssima, uma respeitável tessitura vocal e, ainda por cima, afinadíssima, Andrea põe no chinelo a maioria das... ahã... "cantoras" que tenho visto surgir por aí ultimamente, com "atitude" de sobra e voz e talento de menos.

Andrea no musical - foto: www.entretenimento.band.uol.com.br

Andrea em outra cena do musical - foto: www.oglobo.globo.com
Espero que a atriz tenha novas oportunidades para exibir sua bela voz e até arrisco dizer que, se ela "se metesse" a realizar um show com o melhor da MPB, com um repertório que unisse a bossa-nova a clássicos dos bons tempos de Chico Buarque, por exemplo, faria o maior sucesso - será que não? Pense a respeito, Andrea! E continue estudando canto.

No mais a mais, o que posso dizer é que a serelepe e talentosa atriz continua impagável como a Suely no seriado 'Tapas e Beijos', da Rede Globo, ali sim um programa com roteiro, texto e piadas primorosos. Grande Andrea, grande equipe!

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Cannoleria Casa di Dante e Giuliana Nogueira: uma parceria de sabor.

Costumo medir a qualidade de uma foto de alimento pela quantidade de saliva que ela gera em minhas papilas gustativas ou pelo sabor estético que desperta nas papilas de meu cérebro.

Eu já havia visto, nas redes sociais, fotos de alimentos realizadas por Giuliana Nogueira, uma ótima fotógrafa especializada em "modelos gourmet", por assim dizer. E agora tive a oportunidade de conferir seu trabalho de perto na exposição 'Histórias de Sabores', na Cannoleria Casa di Dante. Só que, desta vez, os astros e estrelas clicados por Giuliana não foram os quitutes e iguarias, mas sim os "magos" – ou chefs – por trás deles.

A bela casa da Rua Frei Caneca que abriga o Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro e a Cannoleria Casa di Dante - Foto: Google Maps

A fotógrafa Giuliana Nogueira à frente da foto em que retratou o chef 
Flavio Miyamura, do restaurante Miya. Foto: Simone Catto
Giuliana fotografou sete chefs de diferentes origens e vivências em seus habitats: Alexandre Leggieri (Cannoleria Casa di Dante), Andres Kotler (Tea Connection), Arthur Sauer (Baby Beef Jardins), Dagoberto Torres (Suri), Flávio Miyamura (Miya), James Hollister (Antonietta Empório & Restaurante) e Marco Renzetti (Osteria del Petirosso). Dagoberto, do Suri, foi um dos grandes incentivadores da fotógrafa, que me apresentou o simpático chef Alexandre Leggieri, proprietário da Cannoleria que abriga a exposição.



O chef Alexandre Leggieri atrás do balcão de sua Cannoleria. Foto: Simone Catto

É claro que eu não perderia a oportunidade de pelo menos experimentar um dos cannoli que fazem a fama do local, mas não sem antes me deliciar com uma taça de Prosecco, já que no sábado do vernissage fazia um calor daqueles. Para quem não conhece, cannoli são deliciosos doces típicos da região da Sicília constituídos por canudos de massa fina frita preenchidos com recheios doces.

Os cannoli do balcão: vários já haviam ido embora! - Foto: Simone Catto

O espaço da Cannoleria funciona nos fundos do casarão que abriga o Instituto Cultural Ítalo-Brasileiro, tradicional escola de italiano de São Paulo. Ao entrarmos pelo arejado corredor lateral da casa, já topamos com algumas mesinhas. O corredor dá acesso à pequena antessala onde está a exposição de Giuliana e que, por sua vez, desemboca num terraço onde estão mais algumas mesas, a cozinha e o balcão com os doces típicos italianos que dão água na boca: cannoli, pastiera di grano e sfogliatella.

O chef Alexandre atende clientes no arejado terraço aos fundos da Cannoleria - Foto: Simone Catto

Vale ressaltar que além dos cannoli que são o carro-chefe da casa, a Cannoleria serve salgados, cafés e alguns vinhos também. Quem quiser, pode até almoçar por lá mesmo. Por R$ 29,90, temos direito a um dos pratos do dia, uma taça de vinho, um doce e um espresso. Achei o preço bem razoável! No sábado havia várias pessoas almoçando ali. Os doces custam em média R$ 5,00 e levei alguns para viagem: cannoli de creme e de ricota com frutas cristalizadas (o mais tradicional), pastiera di grano e sfogliatella. Todos estavam fresquinhos e deliciosos e as massas divinas: difícil dizer qual me agradou mais! Para quem gosta de ricota e frutas cristalizadas, esses ingredientes são bem comuns nos recheios.

Tem gente que não resistiu e "comeu alguns modelos" antes que eu tirasse a foto. Posso com isso??? rs 
Foto: Simone Catto

Vale a pena dar um pulo na CANNOLERIA CASA DI DANTI para conferir o trabalho da Giuliana e provar um dos cannoli da casa. Fica à Rua Frei Caneca, 1.071. Tel.: 3141-0672. A exposição de fotos vai até 25/10. O contato de Giuliana é www.fotografiagourmet.com e a Cannoleria abre de terça a sexta-feira das 15h às 20h e sábados das 10h às 15h. Buon appetito!

Fazenda Nossa Senhora da Conceição. A delícia de um almoço farto em meio à história e à natureza.

Fim de semana, 31ºC em Sampa e aquela vontade louca de dar uma de minhas escapadas "estratégicas". Companhia eu já tinha, e das melhores. E lá fomos nós para a Fazenda Nossa Senhora da Conceição, localizada a cerca de uma hora de São Paulo, no município de Jundiaí.

A vista ao chegar... já gostei! - Foto: Simone Catto

"Onde está Wally"? rs - Foto: acervo pessoal

Com mais de 200 anos de história e 30 mil metros quadrados de muito verde, a fazenda está inserida em uma bela paisagem. De cara topamos com um grande lago, um playground, algumas casinhas rústicas adoráveis e o agradável restaurante 'Dona Maria Helena', enorme e arejado.

Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto
 
Foto: Simone Catto

O restaurante tem três ambientes: um mais fechado, porém bem amplo, uma área externa também grande e um outro espaço externo menor, com vista para o lago e para um belo caramanchão com bancos para as pessoas sentarem.

O amplo e arejado salão externo do restaurante - Foto: Simone Catto

Slow Food é comigo mesmo! - Foto: Simone Catto
A ideia era almoçar, mas, como chegamos cedo para aproveitar o passeio, primeiro fomos explorar a fazenda. Caminhando por ali, descobrimos uma belíssima mansão que, em algum momento, deve ter sido residência de um dos proprietários da fazenda. No pé da escadaria em frente à piscina, esculpido no concreto, estava o ano da construção do imóvel: 1904.

Aparentemente, a casa está muito bem conservada. Ao nos aproximarmos, conseguimos olhar através dos vidros e vimos uma salinha montada com biblioteca e tudo, como se morasse alguém ali. Até TV de plasma havia. Outro ambiente que espiamos através da janela tinha várias fotografias e retratos na parede, bengalas antigas e outros apetrechos. A casa é, na realidade, um museu. Só não sei por que cargas d’água estava fechada em pleno domingo de sol. Uma pena.



O casarão é bonito e imponente - Foto: Simone Catto

A piscina em frente à casa estava bem cuidada - Foto: Simone Catto
 
E aqui, a data de construção daquela maravilha! - Foto: Simone Catto

Vimos algumas hortas espalhadas aqui e ali, alguns bichinhos e, em vários pontos do imenso terreno, máquinas e apetrechos antigos usados nas várias etapas do cultivo do café, tudo devidamente sinalizado. Descobri que em seus primórdios, em 1810, a fazenda produzia cana-de-açúcar, mas, a partir de 1860, o café passou a ser a bola da vez. Vale lembrar que, inicialmente, a mão-de-obra era escrava. Em 1882, chegaram os primeiros imigrantes italianos para trabalhar nas lavouras cafeeiras de lá, introduzindo também a viticultura, uma bela – e muito bem-vinda! - tradição de seu país natal.

A horta de onde saem as verduras fresquinhas diretamente para
nossas saladas - Foto: Simone Catto

E pelo meio do caminho, achamos um amiguinho - Foto: Simone Catto

Um despolpador usado, muito provavelmente, no processo de
beneficiamento do café - Foto: Simone Catto

A fazenda tem uma graciosa capelinha que, infelizmente, também estava fechada e não pudemos conhecê-la. Há também um "Museu do Café", que, adivinhe... estava fechado! Queria entender o porquê de estar tudo fechado.

Adoraria ter entrado na capelinha, mas quem disse que estava aberta?
Foto: Simone Catto

O site da fazenda diz que o local oferece passeios de trator e charrete, trilhas e também um passeio cultural monitorado nos fins de semana e feriados que passa pelos cafezais, museu, capela, senzala e outras atrações, incluindo explicações sobre o maquinário de beneficiamento, moagem e torrefação de café. Fiquei curiosa para fazer o passeio, mas... não havia qualquer monitor ou instrutor para nos conduzir! De tudo isso, vimos apenas o trator puxando um minitrenzinho com famílias e crianças.

Na hora de almoçar, optamos pelo espaço com vista para o lago, mais fresquinho e agradável – fazia um sol de rachar coco! O restaurante é rústico e simples, daqueles lugares onde a gente sente uma imensa paz.

Foi neste salão que almoçamos... uma delícia! - Foto: Simone Catto

A foto saiu meio fora de foco, mas dá para ver que a porção da salada
de rúcula e linguiça caseira é generosa (23,50) - Foto: Simone Catto
A comida, servida à la carte, é farta, gostosa e, segundo o site, preparada em fogão a lenha. Também achei o atendimento muito bom - nossa mesa foi atendida por dois rapazes rápidos, atenciosos e gentis. Para começar, pedimos uma salada de rúcula e linguiça caseira. A linguiça eu passo, mas a rúcula tracei quase toda para forrar o estômago. Estava superfresquinha, diretamente da horta da fazenda!De início, pedi um suco natural porque estava com sede. Mas tão logo o suco terminou, eu não iria dispensar minha tradicional caipirinha de limão, claro! Perguntei ao garçom e ele disse que a cachaça disponível na ocasião era a 'Morro Azul'. Gostei!

A caipirinha de cachaça 'Morro Azul' caiu superbem! (R$ 13,80)
Foto: Simone Catto
O cardápio é bem variado, com feijoada, tutu de feijão, frango da roça, moqueca de cação, picanha e muitos outros pratos caseiros à base de carnes, peixes e frango. Para quem preferir, há porções separadas também – de linguiça, tutu, frituras e outras. Optamos pelo filé mignon para uma pessoa. Sim, os pratos para um servem tranquilamente três bocas famintas! Basta dizer que vieram três enormes bifes de um macio filé mignon acompanhado de generosas porções de arroz, feijão, salada, uma minifarofinha, vinagrete e uma fritura que pode ser batata frita, polenta, mandioca ou então meio a meio. Optamos por meia batata e meia mandioca. Estava tudo uma delícia! Como não gostar de uma comida caseira, farta, gostosa e ainda por cima saboreada em meio a uma paisagem de fazenda? Tudo de bom! Como já seria de se esperar, sobrou muita coisa que, naturalmente, mandamos embalar para viagem.

Além de tudo isso, ainda havia a salada! "Benza Deus!", como diria
minha avó... Tudo isso custou apenas R$ 54,00 - Foto: Simone Catto
Nem preciso dizer que, àquela altura do campeonato, nem passou pela nossa cabeça pedir uma das sobremesas que priorizam doces caseiros como doce de leite, doce de mamão, banana flambada com sorvete e outras delícias que ficarão para uma próxima vez. Por incrível que pareça, o único item que deixou a desejar foi, ironicamente, ele... o cafezinho! Sim, justo em uma fazenda cafeeira! O café, de coador, foi cortesia, mas é bom que o pessoal comece a caprichar para não envergonhar a fazenda. Vamos ver em uma próxima visita!

Se você, como eu, costuma dar umas fugidas energizantes no fim de semana, dê um pulo lá na FAZENDA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO para almoçar. O restaurante funciona aos sábados, domingos e feriados das 11h30 às 15h30, mas não aceita cartões, somente dinheiro ou cheque. A fazenda fica à Rod. Constâncio Cintra, km 72,5 – Jundiaí. No site há um mapa, mas ele está meio desatualizado: a estrada que dá para a fazenda está com um longo trecho de obras e é preciso ficar atento para não perder a entradinha que dá para a estrada de terra, ao lado do Motel 72. Tel.: (11) 4535-1341. www.fnsc.com.br. Adorei!

Gregório Gruber apronta de novo: retratos a quatro mãos na mostra 'Fusões'.

Posso dizer que já conhecia bem a obra de Gregório Gruber, artista plástico cujas paisagens da cidade de São Paulo constituíram o tema de meu trabalho de pós-graduação, que posteriormente virou livro. Entre visitas a seu ateliê, entrevistas e uma amizade que nasceu desde então, pude constatar que Gregório tem uma energia criadora inesgotável. Inquieto e incansável, está sempre à procura de novos suportes e formatos para extravasar seu transbordante talento artístico e, vira e mexe, está nos surpreendendo. A "última das suas" é uma exposição em parceria com a artista plástica Debora Muszkat, no Centro da Cultura Judaica, denominada 'Fusões – Legado e Personas em Transformação'.

'Série Polacas - Homenagem' (2013) - técnica mista - Foto: Simone Catto

'Irmãos Gershwin' (2013) - pintura - Foto: Simone Catto

Pois bem. Quem conhece Gregório sabe que seu trabalho mais famoso é justamente aquele que abordei em meu livro: as pinturas a óleo, acrílicas e pastéis que retratam sobretudo o Centro de São Paulo. Vale do Anhangabaú, 'Minhocão', Viaduto do Chá, Ed. Altino Arantes (antigo prédio sede do Banespa), entre outras paisagens icônicas da cidade, são os "astros" e "estrelas" dessas obras.

Só que, desta vez, Gregório fez algo bem inusitado para seus padrões. Trancou-se em seu ateliê na Serra da Cantareira ao lado de Debora e, durante cerca de um ano, segundo me relatou, criaram juntos retratos de judeus – homens e mulheres - que deixaram sua marca na história, ao lado de membros da família da artista. Um interferindo no trabalho do outro, um destruindo e recriando o trabalho do outro. Um processo que deve ter beirado o visceral e que, imagino, não tenha sido nada fácil! Tente imaginar dois artistas plásticos, cada um com sua linguagem e valores, trabalhando não só no mesmo espaço, mas também por vezes na mesma obra! Loucura, né?!

'Clarice 2' (2013) - pintura - Foto: Simone Catto

'Bernstein' (2013) - técnica mista - Foto: Simone Catto

'Série Família - Casamento' (2012) - técnica mista - Foto: Simone Catto

Pois é. É um tipo de trabalho totalmente diferente daquele com o qual estamos habituados ao analisarmos a totalidade da produção de Gregório. Esculturas, gravuras, aquarelas, assemblages de madeira balsa, enfim, a maioria das plataformas e técnicas utilizadas pelo artista até então, além da pintura, sempre esteve a serviço da paisagem, urbana ou não. Está certo que Gregório já realizou muitos – e ótimos - retratos em diferentes técnicas e épocas, mas eles são minoria em sua trajetória.

Essa exposição conjunta com Debora Muszkat compreende retratos em desenhos, pinturas, sanguíneas e assemblages, tudo com viés fortemente pop e propositalmente kitsch. Com algumas obras me identifiquei mais, com outras menos, mas a mostra resultou, no mínimo, inusitada.

'Marina em Performance' (2013) - pintura - Foto: Simone Catto

'Amy' (2013) - pintura - Foto: Simone Catto

'Einstein' (2013) - carvão - Foto: Simone Catto

Chamaram minha atenção dois belos quadros retratando polacas, as prostitutas judias que chegaram ao Brasil fugidas da miséria na Europa no início do século XX. Ao lado delas e de membros da família da artista estão judeus de várias nacionalidades, profissões, talentos, épocas e estirpes: Freud, Modigliani, Einstein, Amy Winehouse, Leonard Bernstein, o casal Zweig, George e Ira Gershwin e até a artista performática Marina Abramovic, entre outros, todos improváveis vizinhos de parede que ali compartilham o mesmo espaço unidos por dois únicos pontos em comum: as raízes judaicas e o sopro criativo dos autores de seus retratos.

'Série Polacas - Corredor' (2012) - sanguínea e píntura - Foto: Simone Catto

Quer conferir a exposição? 'FUSÕES' estará até 9/2/2014 no Centro da Cultura Judaica – Rua Oscar Freire, 2.500. Tel. 3062-2229 – www.culturajudaica.org.br. Entrada franca.

domingo, 15 de setembro de 2013

'Frances Ha'. A chata em preto e branco.

Às vezes não dá para entender por que tantos filmes ganham boas críticas nos guias especializados e, quando a gente vai conferir, "quebra a cara", por assim dizer. É o que aconteceu comigo em relação ao filme 'Frances Ha'.

Para começar, o filme está classificado como comédia, mas de comédia não tem nada. Juro que não consegui dar UMA só risada, e olhe que estava de ótimo humor no dia em que fui assistir. Frances (Greta Gerwig, também roteirista), a protagonista, é uma jovem beirando os 30 anos que mora em Nova York e está meio perdida na vida. Trabalha como assistente em uma companhia de dança, mas não é talentosa o suficiente para virar efetivamente uma bailarina. Grandalhona e desengonçada, a moça tem um ar um tanto desleixado e, para piorar, é chatíssima. Uma verdadeira "mala", como diriam alguns. Já nas cenas iniciais, presenciamos um diálogo patético entre ela e o pobre do namorado e nos perguntamos o que ele pode ter visto em criatura tão displicente e sem graça. Em outro momento, Frances é convidada a jantar na casa de uma colega e solta comentários tão inadequados e inconvenientes à mesa, diante de pessoas que acaba de conhecer, que ficamos com a nítida impressão de que ela tem problemas de QI. Sim, a mulher é mesmo uma mala! – e está mais para Primícia do que para Louis Vuitton. 

O jantar onde Frances (a loira, Greta Grewig) só dá vexame.

Sempre sem dinheiro, Frances inicialmente divide um apartamento com sua melhor amiga Sophie (Mickey Sumner), a qual, no decorrer do filme, se revela não ser tão "melhor amiga" assim.

Frances (à direita) e sua "muy amiga" Sophie (Mickey Summer)

Quando Sophie decide mudar-se para um bairro mais caro para morar com outra amiga, Frances muda-se para o apartamento de dois rapazes que acaba de conhecer (Michael Esper e Adam Driver) e que, felizmente, são gente boa. Até que esse apartamento também fica financeiramente inviável para ela e Frances vê-se obrigada a mudar novamente. E vai indo assim, de morada em morada, de bico em bico e de "mico" em "mico", tentando ganhar algum dinheiro e sempre vivendo na corda bamba. Se por um lado a gente se solidariza com a falta de perspectivas da garota, por outro não dá para sentir empatia por mulher tão chata. Carisma zero. Nada contra heroínas desajeitadas - longe disso, já que algumas são verdadeiramente adoráveis! -, mas ninguém merece uma heroína sem charme. E Frances é uma delas.

Embora já esteja meio "velhinha" para isso, na falta de coisa melhor, Frances arranja um "bico" 
em um acampamento de verão ao lado de jovens que ainda estão na universidade.

Ao final, fiquei com a nítida impressão de que tentaram fazer um filme simpático e "moderninho" com a intenção deliberada de transformá-lo em "cult", mas para mim o filme tropeçou na própria pretensão. Quer um exemplo? 'Frances Ha' é em preto e branco. Só que filmes em P&B não são para principiantes. E o diretor Noah Baumbach, pelo visto, está longe de ser um Woody Allen. Para começar, um filme em P&B precisa ter uma razão de ser. Precisa contar uma história que justifique essa opção. E também precisa ter boa iluminação, boa direção de arte, precisa prender a atenção. Precisa, enfim, ser um filme bom! Tudo o que 'Frances Ha' não é. Quer um conselho? Vá assistir a 'Flores Raras' que você ganha mais.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

'A Madrinha Embriagada'. Um musical sofisticado com a marca de Miguel Falabella.

Normalmente, as peças apresentadas no Teatro do Sesi (no prédio da Fiesp) costumam ser boas, com elencos de peso, belos cenários, produções ricas e autores interessantes. Ainda por cima, a entrada é sempre franca, o que deve ser possível graças ao financiamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo - sim, a Fiesp. Com 'A Madrinha Embriagada', comédia musical atualmente em cartaz por lá, não é diferente. OK, quem costuma ler meus posts sobre teatro sabe que não sou chegada a musicais. Mas justamente por conhecer a qualidade dos espetáculos apresentados no Teatro do Sesi, fui conferir.

Para começar, a direção é de Miguel Falabella, que também criou, a convite de Cleto Baccic, diretor-geral de produção do espetáculo, a versão em português deste musical de língua inglesa cujo título original é 'The Drowsy Chaperone'. Por si só, o nome de Falabella já representaria, pelo menos para mim, um aval de qualidade. Eu não estava errada. Na montagem brasileira, a narrativa foi deslocada dos Estados Unidos para o Brasil, mais precisamente para a São Paulo dos anos 20, marcada por toda a efervescência cultural que veio no rastro da Semana de Arte Moderna de 22.

Foto: Caio Galucci (programa oficial do espetáculo)

A belíssima cenografia de Renato Theobaldo e Beto Rolnik mostra a decoração rebuscada das mansões burguesas da época e também apresenta soluções criativas para a mudança de ambientes. Não por acaso, a todo momento vemos referências a Tarsila do Amaral, um dos ícones da Semana de Arte Moderna. Os músicos, que no dia de minha visita estavam sob regência da maestrina Laura Visconti, ficam em um mezanino na lateral do palco, separados da cena e da plateia por uma espécie de voil transparente.

Os figurinos são um espetáculo para os olhos. Luxuosos e primorosos, foram fruto de uma pesquisa de Fause Haten sobre os modelos usados por aqui pelos ricos e elegantes da década de 20 e que chegaram ao Brasil com certo atraso em relação à Europa. Basta dizer que a peça usa 180 peças de figurino, 40 perucas e 65 pares de sapatos (!).

Foto: www.estadao.com.br

O espetáculo é uma metalinguagem, com uma história dentro da história. Em uma delas, um simpático narrador (Ivan Parente) fica o tempo todo relatando o enredo de um antigo musical, da poltrona de casa, no canto esquerdo do palco. O rapaz, cheio de nostalgia por uma época que não viveu, vai ouvindo um velho disco de vinil e, conforme seu relato, as cenas do musical são mostradas no restante do palco, como se ele estivesse a imaginar tudo aquilo. E assim temos a outra história.

Ivan Parente, o homem da poltrona com o antigo disco de vinil.
Foto: Caio Gallucci (catálogo oficial do espetáculo)

O musical que encantou o rapaz fala sobre uma famosa atriz, Jane Valadão (Sara Sarres), que decide abandonar os palcos para se casar com o rico, bonitão e bom moço Roberto Marcos (Frederico Reuter). O dono do teatro onde Jane se apresenta, Sr. Iglesias (Saulo Vasconcelos), tenta a todo custo impedir o casamento da atriz para que ela não abandone a carreira e, assim, ele não perca sua mina de ouro. A madrinha da noiva (Paula Capovilla) que dá nome à peça está sempre de pileque e acaba, sem querer, caindo nos braços de um amante latino argentino, Aldolpho, um tipo caricato e engraçado interpretado pelo próprio Cleto Baccic.

Aldolpho, o amante latino interpretado por Cleto Baccic
e a madrinha (Stella Miranda). 
Foto: Caio Gallucci
(programa oficial do espetáculo)
O curioso é que o narrador da poltrona nos conta que, em 1928, o musical ao qual assistimos teria sido criado por um homem chamado "João Canarinho" e supostamente estreado no luxuoso Teatro São Pedro, em São Paulo, por atores brasileiros aos quais são atribuídos nomes, vidas e destinos também fictícios. Algumas das biografias criadas para esses atores são fantasiosas e mirabolantes, bem ao estilo da mística em torno da vida real de tantos astros e estrelas. O personagem Aldolpho, por exemplo, teria sido interpretado, em 1928, por um suposto "Rolando Bartelli", descrito como um típico latin lover argentino e canastrão que arrancava suspiros das moçoilas.

Temos, portanto, três planos temporais diferentes que se entrelaçam na peça: primeiro, o tempo do narrador da poltrona. Segundo, o tempo dos personagens do musical que ele narra e ao qual assistimos. E terceiro, o tempo dos atores fictícios que teriam encenado o musical em 1928.

Criado unicamente para divertir e entreter com toda aquela parafernália visual, o espetáculo tem uma trilha festiva e uma narrativa pueril encoberta pelo talento de um elenco tarimbado e também pela engenhosidade do roteiro, da direção e da produção, que compensam qualquer lacuna que porventura pudesse existir. Consta que, durante a produção da peça, 2.600 currículos foram avaliados e cerca de 500 atores participaram das audições. Um dos momentos altos é um belíssimo número de sapateado pela dupla Frederico Reuter e Fernando Rocha, que deu um verdadeiro show. Só esse número já valeu o espetáculo!

Ficha técnica parcial:

Direção e Versão: Miguel Falabella
Direção Musical: Carlos Bauzys
Coreografia: Kátia Barros
Figurinos: Fause Haten
Cenografia: Beto Rolnik e Renato Theobaldo
Texto: Bob Martin e Don Mc Kellar
Músicas e letras: Lisa Lambert e Greg Morrison
Elenco: Ivan Parente, Sara Sarres, Frederico Reuter, Stella Miranda, Cleto Baccic, Saulo Vasconcelos, Kiara Sasso, Fernando Rocha e outros.

Se você gosta de teatro, vale a pena tentar um ingresso para 'A MADRINHA EMBRIAGADA'. Em cartaz no Centro Cultural Fiesp Ruth Cardoso - Teatro Sesi São Paulo - Av. Paulista, 1.313. Tel.: 3146-7406. Quarta a sexta-feira: 21h / sábado: 16h e 21h / domingo: 19h. Entrada franca. 

Dica: a bilheteria abre às 13h, mas só é possível retirar ingressos para espetáculos do mesmo dia. Cada pessoa tem direito a até dois ingressos. Se preferir, você pode fazer uma reserva online no site do Sesi-SP. Para setembro as reservas online já estão esgotadas, mas para outubro poderão ser feitas a partir de 20/9, às 8h. Bom espetáculo!

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

'Allez, Allez!'. Um bistrô charmoso que faz bonito na Restaurant Week.

Uma das coisas que me dão prazer nessa vida é receber convites inesperados para jantar ou beber um vinho em noites com clima particularmente agradável. Foi o caso da segunda-feira passada, em que fui convidada a experimentar o menu do bistrô 'Allez, Allez!' preparado especialmente para a 'Restaurant Week'. Confesso que tinha certo preconceito com relação à 'Restaurant Week' em virtude da quantidade de reclamações de clientes insatisfeitos com o tamanho das porções ou, principalmente, com o atendimento. No entanto, como se tratava de uma segunda-feira – dia em que as casas normalmente estão vazias – e de um bistrô diferenciado, intuí que iria apreciar minha experiência. E lá fui eu.

De cara, o lugar é uma graça. Instalado há quase 10 anos em uma casa antiga da Vila Madalena, o 'Allez, Allez!' tem aspecto extremamente acolhedor. Já à entrada há um agradável terraço com mesinhas, e o salão, aconchegante, é muito parecido com o de alguns bistrôs que visitei em Paris. Sim, a casa tem um arzinho romântico, sendo perfeita para um jantar especial e conversas ao pé do ouvido.

Foto: www.restaurantweek.com.br

Foto: www.obaoba.com.br

Foto: Luis Simione (www.restaurantweek.com.br)
Achei o menu do jantar para a 'Restaurant Week' bem atraente. Como entrada, o restaurante oferece creme de cebola ou salada caprese (buquê de folhas, tomate, pesto de manjericão, mussarela de búfala e flores comestíveis). Pedi o creme de cebola, que estava entre os melhores que já saboreei na vida. Textura perfeita, tempero na medida certa... amei! O prato, pequenino, estava do tamanho ideal para uma refeição com entrada, prato principal e sobremesa.

As opções de prato principal são: cabillaud aïoli (bacalhau fresco, creme de alho assado, batata ao garfo e minilegumes), linguine ao vôngole e polvo ou o tradicional coq au vin (galinha caipira, purê de batata, cogumelos e minilegumes glaceados). Optei pelo linguine ao vôngole e polvo, que não economizou nos frutos do mar e realmente estava delicioso e bem feito. O prato era bem servido, mas infelizmente não tenho fotos: como o convite para jantar foi realmente uma surpresa, saí de casa sem minha câmera, e o celular - oh, tristeza! - estava sem bateria. Por isso, as poucas fotos que consegui da casa e dos pratos não são de minha autoria (todas estão com os devidos créditos). 

Para a sobremesa, podíamos optar entre a delícia de abacaxi (abacaxi com creme de leite) ou o mini crème brûlée, que foi unanimidade na mesa. Como eu previa, a escolha foi acertadíssima: o creme estava leve e uma delícia com sua delicada casquinha flambada por cima... nham! Também aqui a miniporção foi perfeita para que pudéssemos degustar cada etapa da refeição em toda a sua plenitude.

Foto: Luis Simione (www.restaurantweek.com.br)

Quer experimentar também? Vá lá que vale muito a pena! O ALLEZ, ALLEZ! fica na Rua Wizard, 288 – V. Madalena. Tel.: 3032-3325. www.allezallez.com.br. Só para lembrar: a 'Restaurant Week' vai até 15 de setembro, mas prefira o início da semana para jantar mais sossegado(a). O jantar com entrada, prato principal e sobremesa sai por R$ 47,90, e o almoço a R$ 34,90.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

'Flores Raras'. Assista ao filme, leia o livro e descubra duas mulheres extraordinárias.

Faz mais de dez anos que li um livro intitulado 'Flores Raras e Banalíssimas' e que muito me marcou então. De autoria de Carmen L. Oliveira, ele narra uma história de amor transgressora situada em um período nostálgico da história do Brasil: as décadas de 50 e 60, tendo como pano de fundo a concepção e construção do parque do Flamengo, no Rio de Janeiro, a bossa-nova, a queda do governador do então Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, e o advento do Golpe Militar. As protagonistas dessa louca história de amor são Lota de Macedo Soares, rica, visionária, arrojada e realizadora, e Elizabeth Bishop, poetisa norte-americana que figura no panteão dos melhores da língua inglesa.  

Há muito não ouvia falar dessas duas mulheres extraordinárias até saber da estreia do filme ‘Flores Raras’, de Bruno Barreto, ao qual tive a oportunidade de assistir em um fim de semana no excelente Cine Livraria Cultura.

Miranda Otto e Glória Pires, soberbas como Elizabeth Bishop e Lota de Macedo Soares.

Baseado no livro mas não totalmente fiel a ele, o filme mostra como Lota, mulher culta, determinada, frequentadora das altas rodas e espécie de arquiteta autodidata, recebe em sua casa encravada na mata de Samambaia, em Petrópolis - RJ, a tímida forasteira Bishop (a bela Miranda Otto), que estava meio perdida na vida e no alcoolismo, em busca de outros ares para recobrar a inspiração de escrever. Lota, interpretada pela excelente Glória Pires, tem uma relação homossexual estável com outra americana, Mary (Tracy Middendorf), mas acaba se apaixonando por Bishop, é correspondida, e aquela que deveria permanecer no Brasil apenas dois dias acaba ficando 16 anos.

Mary (Tracy Middendorf), a ex-amante, e Lota.

Elizabeth chega trazendo sua timidez na bagagem, mas a perdeu rapidinho.

Durante alguns anos, o casal vive um relacionamento idílico numa paisagem de sonho: a exuberante casa 
de Lota na mata de Samambaia, em Petrópolis. 

As duas vivem felizes durante algum tempo e Bishop produz alguns de seus melhores poemas durante esse interlúdio idílico. Porém, a avidez de Lota em concretizar seu ambicioso projeto arquitetônico para o parque à beira-mar do Aterro do Flamengo acaba consumindo todo seu tempo e energia, relegando Bishop a um segundo plano. A escritora recai então no alcoolismo, e as duas começam a se afastar até Elizabeth aceitar uma oferta para dar aulas em uma universidade americana. A partir daí, Lota mergulha em uma espiral decrescente até o desfecho trágico.



Um dos aspectos que chamam atenção, no filme, é o clima liberal que reina no lar do casal. Bem relacionada, Lota recebe amigos para jantar, frequenta recepções ao lado de Elizabeth e a relação homoafetiva das duas parece ser encarada com naturalidade em uma época supostamente muito mais moralista e intolerante. Detalhe: a casa onde as duas vivem no filme não é a residência onde o casal realmente viveu na mata de Samambaia, mas uma casa projetada por Oscar Niemeyer que fica no Rio Grande do Sul. 

É curioso como, em determinado momento no início do filme, para apaziguar Mary, a parceira traída, Lota lhe propõe adotar uma criança, sonho há muito acalentado pela outra. E assim se faz. As três mulheres, mais a criança, passam eventualmente a conviver sob o mesmo teto, apesar do ciúme de uma ou de outra – principalmente de Mary em relação à americana. É crível imaginar que a aceitação desse casal heterodoxo tenha se dado, à época, graças ao prestígio social e dinheiro de suas protagonistas.

Lota e Elizabeth recebem em Samambaia diversas personalidades, entre as quais o governador 
da Guanabara, Carlos Lacerda, interpretado por Marcelo Airoldi.

Aqui vemos a criança adotada por Mary, uma menininha cercada de carinho pelas mulheres.

Só sei que saí do cinema com uma sensação extremamente prazerosa por, passada mais de uma década, compartilhar novamente da intimidade, das realizações e também dos percalços daquele casal tão improvável quanto fascinante. Enfim, trata-se de um belo filme que merece ser visto por retratar uma época interessante de nosso país e, principalmente, por resgatar e desvelar o relacionamento amoroso entre duas personagens tão excepcionais. Veja o filme, mas, sobretudo, não deixe de ler o livro. É daqueles que a gente começa e não consegue largar mais!  

FLORES RARAS não está mais em cartaz no Cine Livraria Cultura, mas está em outras boas salas, como Reserva Cultural e Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca e Augusta. Vale a pena assistir!

Ficha técnica parcial:

Diretor: Bruno Barreto
Elenco: Glória Pires, Miranda Otto, Tracy Middendorf, Marcelo Airoldi e outros
Direção de Produção: Claudia Novaes
Direção de Arte: José Joaquim Salles
Diretor de Fotografia: Mauro Pinheiro
Figurino: Marcelo Pies