Confesso
que estava procrastinando um bocado para escrever sobre esse filme. Ele acabou
de estrear em São Paulo, está com uma boa cotação nos guias especializados, mas
devo dizer que o achei um tanto deprimente – talvez pela rudeza como a
história, já pesada por si só, foi abordada e narrada.
Para
quem não sabe, o enredo de 'Bem-vindo a
Nova York', filme de Abel Ferrara, é baseado em um escândalo sexual ocorrido
há uns três anos nos Estados Unidos. Na ocasião, Dominique Strauss-Kahn, um
francês sessentão todo-poderoso do Fundo Monetário Internacional e que inclusive
aspirava à presidência da República pelo Partido Socialista, tentou violentar a
camareira do hotel cinco-estrelas onde se hospedava em Manhattan, e ela meteu-lhe um processo. A história estourou na imprensa do
mundo inteiro e o réu renunciou a seu cargo no FMI, embora não tenha permanecido
quase nada atrás das grades.
No
filme, o protagonista pervertido chama-se M. Devereaux e quem o interpreta é o excelente
Gerard Dépardieu, magistral em sua caracterização. Já no início, percebe-se o
tipo de homem que ele é: um sujeito totalmente devasso, repugnante e viciado em
sexo que não poupa de suas investidas nenhuma mulher que cruze seu caminho. Logo de cara, há uma sucessão de cenas de orgia em que Devereaux e seus "amigos" divertem-se com prostitutas de luxo em hotéis e até no próprio local
de trabalho. Em determinado momento, inclusive, ele tenta "empurrar" uma delas, sem
pudor algum e sem sucesso, para cima de outro executivo de quem deseja obter
vantagens. As cenas de sexo são mostradas com tal crueza, e o clima é tão
barra-pesada, que é impossível não sentir asco por aquele homem.
Gerard Dépardieu em uma das cenas de orgia. |
Para
completar, Depardieu imprime todo o peso de sua imoralidade ao aspecto físico
do personagem, um homem imenso que anda com dificuldade e se arrasta para lá e
para cá com um corpanzil disforme e uma respiração constantemente ofegante.
Devereaux
é casado com a elegante e discreta Simone, interpretada por Jacqueline Bisset,
que até o escândalo estourar suporta heroicamente as traições e libertinagens
do marido, fornecendo-lhe todo o apoio necessário para que se candidatasse à
Presidência da República na França. Quando o homem vai para a cadeia, é ela que
levanta o dinheiro para pagar a fiança milionária que irá libertá-lo. Apesar de
passar por situações humilhantes na prisão, sobretudo se considerarmos sua
posição social e financeira, Devereaux mal tem tempo de sentir o que significa realmente
estar confinado numa cela. E em uma reflexão final, sua absoluta ausência de
moralidade fica patente na forma autoindulgente como encara seus atos e seu
comportamento.
Jacqueline Bisset interpreta 'Simone', a esposa elegantérrima com paciência de Jó e estômago de avestruz. |
Naturalmente,
conforme assinala um letreiro no início do filme, nem tudo o que é mostrado corresponde
à realidade, inclusive porque seus realizadores não teriam como ter acesso a
determinadas informações, como as nuances do relacionamento do próprio Strauss-Kahn
com a esposa e alguns detalhes sórdidos de suas aventuras sexuais. Não sei se,
caso o diretor tivesse tido uma mão mais leve e abordado o tema de forma mais
branda, sobretudo nas cenas de sexo, minha impressão teria sido diferente.
Desconfio, contudo, que a intenção tenha sido essa mesmo: chocar, para que o
espectador fosse impactado com a sordidez da situação em toda a sua dimensão.
Ficou
curioso(a)? ‘Bem vindo a Nova York’ está em cartaz no Espaço Itaú de Cinema –
Frei Caneca, no Caixa Belas Artes, no Reserva Cultural e em outras salas.
Ficha técnica
parcial
Direção:
Abel Ferrara
Elenco:
Gérard Dépardieu, Jacqueline Bisset, Marie Mouté, Amy Ferguson, Paul Calderon e
outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário