domingo, 16 de março de 2014

Riviera Bar. Ícone etílico de Sampa resgatado com respeito e estilo.

Anos atrás, sempre que passava pelo final da Avenida Paulista, pertinho da Consolação, eu prestava atenção no formato interessante daquele bar antigo e decadente, todo feito de tijolos de vidro e cercado por uma muretinha de concreto vazado. A placa, acanhada, dizia 'Riviera Bar'. Então eu pensava que aquele bar, naquele ponto tão privilegiado de Sampa, em seus dias de glória devia ter sido um lugar supermoderno que "bombava" de gente. Curiosa, fui perguntar ao São Google. Descobri que o prédio que abriga o estabelecimento, o Edifício Anchieta, foi fundado em 1941, é residencial e considerado um dos grandes ícones do modernismo paulistano. O bar, no térreo, foi fundado em 1949 e infelizmente despejado em 2006, porque desde 1996 o proprietário não conseguia quitar as dívidas. Também, pudera! Com os impostos acachapantes deste país, qualquer empresário precisa fazer mágica para sobreviver.

Foto da Internet - sem créditos.


O interno do bar - foto da Internet (sem créditos).

A ideia inicial do Riviera era reunir senhoras chiques, mas essa vocação high society logo caiu por terra: na década de 50, o bar começou a atrair professores universitários, políticos e esportistas. Nos anos 60 e 70, auge da ditadura, virou ponto de encontro do pessoal de esquerda. Artistas, músicos, ‘culturetes’ (quando esse termo ainda nem existia...) e figurinhas carimbadas da boêmia paulistana discutiam ideias, namoravam e ferviam por ali, normalmente vários degraus etílicos acima do aceitável. Pelas mesas do Riviera circularam nomes como Chico Buarque, Elis Regina, Toquinho, Cláudio Tozzi, Zé do Caixão, os meninos do Dzi Croquetes e os cartunistas Laerte, Chico e Paulo Caruso, entre outros frequentadores da night. Consta que a personagem Rê-Bordosa, de Angeli, foi inspirada não em uma, mas em várias habituées do local.

Eu nunca havia entrado lá. Quando comecei a frequentar bares, o lugar já estava decadente. Portanto, qual não foi minha alegria ao descobrir que o lendário bar seria reaberto por obra e graça da dobradinha Facundo Guerra e Alex Atala, duas referências de qualidade e profissionalismo em entretenimento e gastronomia? Criador de várias casas noturnas bem-sucedidas, Facundo Guerra, imaginei, não iria dar ponto sem nó. A primeira prova disso foi a parceria com Atala, um dos chefs mais festejados do país e agora do mundo, para recriar o cardápio do bar. No mínimo, teríamos comidinhas de qualidade. Dito e feito.

O novo luminoso de néon - foto: Simone Catto

Estive lá em uma terça-feira porque, desde a reabertura, no segundo semestre do ano passado, a casa tem lotado, sobretudo de quarta a sábado, quando há jazz ao vivo – uma novidade de Facundo Guerra. Embora eu não tenha conhecido o bar em seus tempos áureos, parece-me que o projeto arquitetônico atual, de autoria de Márcio Kogan, preservou e restaurou os principais elementos originais, como as famosas paredes de vidro que visualizamos do lado de fora e a escada que conduz ao mezanino. Eu soube, contudo, que a casa reabriu com o dobro do tamanho da original. A única coisa que estranhei foi o andar térreo que, no velho Riviera, era ocupado por mesas e atualmente está todo tomado por um grande balcão vermelho em formato de ameba, nos mesmos moldes do 'Bar Balcão', na Rua Melo Alves. OK, ficou bonito, é cool e facilita a aproximação das pessoas, mas confesso que fiquei levemente decepcionada ao não encontrar as famosas mesinhas. Enfim, é outra proposta.

O salão onde antes havia mesinhas - foto:  Felipe Gombossy/Época SP

E aqui, vista parcial do balcão e as famosas escadas que conduzem ao piso superior - foto: Simone Catto

O andar de cima é um espaço superagradável e charmoso à meia-luz. Ocupei uma deliciosa mesa encostada na parede de vidro, com vista para o finalzinho da Avenida Paulista. Tudo de bom.

O aconchegante andar superior em foto do Facebook do Riviera.

E aqui uma foto um tanto 'meia-boca' tirada do celular, já que eu estava sem câmera - foto: Simone Catto.

A vista de minha mesa: finalzinho da Av. Paulista - foto: Simone Catto

O menu é grande e variado, com petiscos, sanduíches, pratos e coquetéis preparados com maestria. Como ninguém estava morrendo de fome, fomos de petiscos. Para iniciar, pedimos a porção de bolinhos de arroz. Saborosíssimos, com a crocância certa e um leve toque de queijo, aqueles bolinhos estavam entre os melhores que já comi na vida! O único senão é que a porção vem com apenas seis unidades. Poderia ser mais bem servida, uma vez que o preço passa dos R$ 20,00. Para acompanhar, tomei uma margarita que estava no ponto certo.

Os bolinhos de arroz são uma delícia, mas a porção é um tanto minguadinha - foto: Simone Catto

Uma amiga pediu o Royal (R$ 31), um clássico repaginado do Riviera. Trata-se de um sanduíche montado no pão de forma e recheado com queijo, rosbife, tomate e picles de pepino. É bem grande e dá para dividir tranquilamente.

Entre um gole e outro, conversa vai, conversa vem, os bolinhos de arroz acabaram rapidinho - como já seria de se esperar. Aí pedimos uma porção de mandioca frita, bem mais generosa. Pode parecer exagero, mas até uma porção prosaica como essa pode (e deve!) ser preparada com primor. Pois esse clássico dos barzinhos paulistanos tornou-se um show de sabor lá no Riviera. A textura das mandiocas estava uma coisa de louco de tão boa. Ao mesmo tempo em que eram crocantes, elas desmanchavam na boca de tão macias. Coisa de alquimista de cozinha!

A porção de mandiocas era mais generosa e estava entre as melhores que já comi - foto: Simone Catto

Como naquele dia eu estava com vontade de doce, pedi a Torta Riviera, uma torre composta de massa de crepe com chantili em camadas e laranjas em calda. Uma coisa leve que deixa na boca um gosto de céu. Maravilha dos deuses!

A foto saiu péssima, mas garanto que a saborosíssima Torta Riviera
deixou minhas endorfinas bem felizes! - Foto: Simone Catto

Detalhe IM-POR-TAN-TÍS-SI-MO que faz a diferença: o Riviera abre de domingo a domingo às 12h e sempre fecha depois da meia-noite. Ou seja: é um daqueles refúgios que não deixam nenhum faminto na mão, com forte vocação para se tornar um clássico do calibre de casas como Mestiço, Ritz e Spot, porém com preços mais acessíveis.

Até breve, Riviera! - Foto: Simone Catto

Em tempo: peço desculpas pelas fotos sofríveis, é que precisei tirá-las do celular. Mas pelo menos dá para ter uma ideia do ambiente e da dimensão dos pratos. 

O RIVIERA está na Av. Paulista, 2584 – tel.: 3231-3705 - www.rivierabar.com.br. Abre todos os dias a partir do meio-dia e, de quarta a sábado, tem jazz ao vivo à noite. Já entrou para minha lista de preferidos!

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