terça-feira, 11 de julho de 2017

Mostra de arte sobre papel tem Degas, Picasso, Matisse e ótimas surpresas.

Sempre foi uma prática comum, entre os grandes pintores e também escultores, fazer desenhos preparatórios antes de partir para a obra definitiva, fosse ela uma pintura ou escultura. Muitos desses esboços ou estudos eram feitos em grafite ou nanquim sobre papel, por exemplo. Porém, quando falamos de artistas detentores de um talento excepcional ou um daqueles seres tocados pela genialidade, não raro esses desenhos se sustentam por si mesmos, adquirindo a autonomia de verdadeiras obras de arte.

É óbvio que muitas vezes o artista já concebeu o desenho como obra final, autônoma, e não necessariamente como um esboço preparatório para outra obra. Creio que as duas vertentes estejam presentes na mostra 'Tesouros da Fundação MAPFRE – obras sobre papel', atualmente no Museu Lasar Segall. A exposição reúne 59 obras criadas por artistas de diferentes nacionalidades entre o final do século XIX e meados do século XX, pertencentes ao acervo da multinacional espanhola do ramo de seguros. Além de desenhos, há também aquarelas, colagens, obras com técnica mista, mas sempre criadas sobre papel e pertencentes a diferentes estilos: figurativas, abstratas, surrealistas, simbolistas, dadaístas - algumas poéticas, outras dramáticas e algumas francamente irônicas.

Fui ao vernissage no dia 4 de julho, terça-feira, mas havia tanta gente que não consegui apreciar direito a exposição. Consegui retornar ao museu três dias depois para observar calmamente as obras e selecionei algumas que chamaram minha atenção. Por vezes, a película de vidro que as protege prejudicou a foto, peço desculpas, mas mesmo assim dá para visualizá-las.

Noite do vernissage, 4 de julho - Foto: Simone Catto

De cara, somos saudados por uma bela espanhola de Francis Picabia (1879-1953), um dos principais nomes do dadaísmo. Aqui, no entanto, o artista deixou o dadaísmo de lado para representar sua espanhola de forma convencional, com o característico pente no cabelo, traços delicados e olhos azuis.

Francis Picabia - 'Espanhola - Mulher com pente' (1922) - aguada e grafite s/ papel
Foto: Simone Catto

A outra espanhola da mostra é obra do cubista Albert Gleizes (1881-1953), contemporâneo de Picabia. Gleizes nos brinda com uma colorida e exuberante dançarina de flamenco que, embora seja anterior à obra do primeiro, tem traços modernos.

Albert Gleizes - 'Bailarina Espanhola' (1916) - têmpera s/ papel - Foto: Simone Catto

E já que falamos em cubismo, é evidente que no acervo de uma organização espanhola como a MAPFRE não poderiam faltar obras de Pablo Picasso (1881-1973).

Pablo Picasso - 'Arlequim e Polichinelo' (1924) - têmpera s/ papel - Foto: Simone Catto

No entanto, sabemos que nem tudo foi cubismo em Picasso... é o que mostra o nanquim a seguir, uma imagem pungente e dramática da maternidade.

Pablo Picasso - 'Maternidade' (1902-3) - nanquim s/ papel - Foto: Simone Catto

Já deu para notar que na mostra não faltam expressivas representações de mulheres. Salvador Dalí (1904-1989), conterrâneo de Picasso, comparece com um nu nada surrealista que remete de imediato à tradição clássica. Uma curiosidade: parece que o artista fez o desenho no primeiro papel que lhe caiu às mãos, já que dá para visualizar uma pauta impressa no verso, indicando que não se trata de um papel de desenho. 

Salvador Dalí - 'Mulher' (1923) - grafite s/ papel - Foto: Simone Catto

O nu do francês André Lhote (1885-1962), também criado em grafite, tem uma pose menos convencional e um título muito feliz.

André Lhote - 'Bacante' (1910) - grafite s/ papel - Foto: Simone Catto

E o que dizer da pastoral hedonista do catalão Joaquim Sunyer (1874-1956)? Impossível não lembrar das banhistas de Cézanne e das festivas personagens de Matisse.

Joaquim Sunyer - 'Pastoral' (1918) - óleo e têmpera s/ papel - Foto: Simone Catto

Porém, nem todas as mulheres parecem estar se divertindo tanto... algumas estão sérias, pensativas, impenetráveis em seus rostos simbolistas.

Fernand Khnopff (1958-1921) - 'A Desconfiança' (1893)
platinotipia colorida com crayon em cores - Foto: Simone Catto

Sir Edward Coley Burner-Jones (1833-98) - 'Retrato de uma jovem, possivelmente
Maria Zambaco'
(1874) - lápis s/ papel - Foto: Simone Catto

Algumas senhoras estão ocupadas organizando a agenda... como mostra o desenho abaixo, realizado com elegante economia de traços por Henri Matisse (1869-1954). 

Henri Matisse - 'Mulher com agenda' (1944) - nanquim s/ papel - Foto: Simone Catto

Edgar Degas (1834-1917) é um artista que fez incontáveis estudos e desenhos. Ele frequentava os bastidores da Ópera de Paris e registrou, sobre papel, centenas de bailarinas tendo aula, ensaiando, descansando, ajeitando a roupa ou então em cena, no próprio palco. A maioria desses desenhos são obras de arte da mais alta qualidade, suficientes em si mesmas, e vários também serviram como estudos para pinturas a óleo que Degas criou posteriormente no ateliê. O desenho da exposição é típico e não duvido que a bailarina abaixo, com essa pose, tenha figurado em uma ou mais pinturas do artista.

Edgar Degas - 'Duas bailarinas' (c.1890) - carvão e sanguínea s/ papel-carbono - Foto: Simone Catto

Invariavelmente, as mulheres do austríaco Gustav Klimt (1862-1918) aparecem altivas, orgulhosas de sua condição feminina. Como a mulher da imagem abaixo, que tem o queixo elevado, sinal indiscutível de altivez, e parece sorrir feliz. A foto não faz jus à grandeza da obra ao vivo, mas os belos traços e o inconfundível estilo de Klimt estão inegavelmente presentes.

Gustav Klimt - 'Mulher sentada com chapéu' (c.1910) - grafite e lápis
de cor azul s/papel japonês - Foto: Simone Catto

A mulher do espanhol Isidre Nonell (1872-1911) também está sentada, mas parece ter aspirações bem mais simples que a de Klimt.

Isidre Nonell - 'Mulher sentada' (1906) - lápis gorduroso e aguada de cor
s/ papel vergê - Foto: Simone Catto

A sátira implacável do alemão George Grosz (1893-1959) diverte na imagem em que dois casais com intenções para lá de questionáveis compartilham a mesma sala burguesa.

George Grosz - 'Uma tarde em Berlim' (1929) - aquarela, grafite e tinta s/ papel - Foto: Simone Catto

Interessantes obras abstratas também marcam presença na exposição e algumas se destacam pelo colorido vibrante, como as obras de Paul Klee (1879-1940) e Sonia Delaunay (1885-1979).

Paul Klee - 'Jovem palmeira' (1929) - aquarela e grafite s/ papel - Foto: Simone Catto

Sonia Delaynay - 'Disco Portugal' (1915) - têmpera s/ papel - Foto: Simone Catto

Se você mora em São Paulo ou está temporariamente na cidade, vale a pena conferir a exposição, lembrando que a entrada é franca e o museu fica a meio caminho entre as estações de metrô Santa Cruz e Vila Mariana. Depois ainda dá para tomar um cafezinho por lá mesmo!

Anote: 'TESOUROS DA FUNDAÇÃO MAPFRE – OBRAS SOBRE PAPEL'. Museu Lasar Segall – Rua Berta, 111 - Vila Mariana. Tel.: (11) 2159-0400. Abre de quarta a segunda, das 11h às 19h. Entrada franca. Até 28/8.

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