sábado, 8 de julho de 2017

A mansão do pintor Caillebotte perto de Paris é aberta ao público.

Fontes: Les Echos e Proprieté Caillebotte | Tradução e adaptação: Simone Catto

Gustave Caillebotte (1848-94) foi um homem incomum, uma daquelas raras criaturas que têm o dom de iluminar a vida de quem cruza seu caminho. Herdeiro de uma grande fortuna, teve tempo e meios para se dedicar a todas as atividades que o faziam feliz: pintura, jardinagem, esportes náuticos, filatelia e muitos outros interesses. Com um olho inconfundível para a beleza e a arte, reconheceu de imediato o valor das pinturas impressionistas assim que visitou a primeira exposição do movimento. Mais do que isso, tornou-se amigo de seus artistas e, dotado de uma generosidade inesgotável, ofereceu bem mais do que amizade a esse grupo de pintores geralmente depauperados: comprou diversos de seus trabalhos e ajudava-os a pagar suas contas. Agora, os franceses poderão visitar a residência de férias onde a família Caillebotte passava muitas temporadas e onde o pintor criou cerca de 90 pinturas nos verões da década de 1870.

A mansão da família Caillebotte - Foto: Christophe Brachet

Gustave Caillebotte
A mansão familiar que o pintor Gustave Caillebotte frequentou por quase 20 anos, localizada no distrito de Essonne, abriu suas portas em 10 de junho. Decoração e mobiliário foram reconstituídos conforme os inventários anexados às notas de venda da propriedade. A reabertura do local de férias dos Caillebotte, no município de Yerres, havia sido anunciada há tempos. É a concretização de um projeto de mais de vinte anos iniciado pelo prefeito, Nicolas Dupont-Aignan, bem antes que ele se tornasse potencial Primeiro Ministro de Marine Le Pen entre os dois turnos da eleição presidencial da França, desagradando parte de seu eleitorado local e a totalidade dos prefeitos do conglomerado Val d'Yerres-Val de Seine, presidido por ele. Porém, independentemente de suas inclinações políticas, é inegável que o prefeito fez bonito ao investir na preservação de um bem tão importante para a história e o patrimônio locais.  


O parque da propriedade da família é extremamente acolhedor para uma leitura, passeio ou bate-papo - Foto: C. Fauré

Pintura de Gustave Caillebotte - 'Parque da propriedade Caillebotte em Yerres' (1875) - óleo s/ tela
65 X 92 cm - coleção particular

A propriedade de Yerres, comprada em 1870 pelo pai de Caillebotte, rico negociante de tecidos, era um local de encontro para seus filhos. Gustave, o pintor, e seu irmão Martial, compositor, costumavam ir à casa para descansar e passear de barco no Rio de Yerres, que permeia toda a propriedade, até a venda do local, em 1879. Após a restauração do parque e sua abertura ao público, seguida da abertura de uma velha construção agrícola transformada em espaço de exposições, em 2009, a mansão foi inaugurada em junho de 2017.

O Rio de Yerres, onde Caillebotte fez tantos passeios de barco ao lado da família - Foto: Christophe Brachet

Pintura de Gustave Caillebotte - 'Botes no Rio Yerres' (1877) - óleo s/ tela - 103,51 X 155,89 cm
Milwaukee Art Museum - EUA 

O projeto era deixar a construção tal qual havia sido reestruturada, decorada e mobiliada entre 1824 e 1843, conforme os documentos de venda, mostrando que poucas mudanças foram realizadas até a chegada dos Caillebotte. Foi Pierre Frédéric Borrel, antigo chef proprietário do Au Rocher de Cancale, célebre restaurante da rua Montorgueil que reunia artistas e políticos de Paris, o responsável pela transformação de um domínio senhorial do ano de 1600 em uma aconchegante villa neopalladiana. Colunatas, estátuas e baixos-relevos fazem contraponto a um parque no estilo inglês percorrido por riachos e adornado por outras construções pitorescas erigidas exclusivamente para embelezá-lo.

L'Orangerie - Foto: Stéphane Melard

A êxedra - Foto: Christophe Brachet. Esse recanto foi construído pelo antigo proprietário Pierre Frédéric Borrel
e inspirado nas
 êxedras da Grécia Antiga, pátios circulares onde os filósofos e anciões se reuniam para conversar.

Móveis recomprados

Após abrir falência, o chef revendeu a propriedade à viúva de Martin-Guillaume Biennais, carpinteiro nomeado por Napoleão e depois pela coroa. Ela levou à mansão móveis da loja do marido recém-falecido, dentre os quais um conjunto de dormitório que nem estava mais no país. O mobiliário havia sido dispersado nos anos 1960, cerca de quinze anos antes que a prefeitura adquirisse a propriedade pelo valor simbólico de um franco. Dizia-se que estavam na América, mas haviam sido comprados pelo incorporador de imóveis Robert de Balkany para mobiliar sua residência particular parisiense. Após o falecimento do empresário, os móveis apareceram na Sotheby's para serem leiloados. A prefeitura pôde recomprá-los graças aos lances de uma delegação do "direito de preferência", uma lei francesa que confere à Administração o direito de ter preferência na compra de um bem relevante sobre outro comprador. Normalmente, é um direito reservado aos museus do Estado, para que importantes bens culturais permaneçam no país e fiquem acessíveis a seus cidadãos.

Os trabalhos realizados sob a égide dos Monumentos Históricos custaram 1,6 milhões de euros e foram financiados em mais de 50% pela municipalidade e instituições governamentais. Várias fundações contribuíram com empréstimos ou doações ao projeto. O Mobilier National, por exemplo, emprestou por 30 anos vários móveis de época que constituem três quartos do mobiliário da mansão, e o restante foi garimpado pelo coordenador do projeto, Nicolas Sainte-Fare Garnot, curador-chefe do encantador museu Jacquemart-André, em Paris. Além disso, mais de 740 mecenas individuais e empresas particulares também contribuem com doações. Ou seja: num país onde a cultura é valorizada e o dinheiro não é desviado por governantes corruptos, os empresários não têm medo de investir. Melhor nem comparar com o Brasil para não sentir vergonha ou depressão!

A Sala de jantar da mansão - Foto: site da Proprieté Caillebotte

Descoberta de revestimentos de época

Várias pesquisas do escritório de arquitetura Vermeulin permitiram descobrir a disposição inicial das peças, mas também as cores dos revestimentos da época. "O visitante vai encontrar um conjunto de artes decorativas e arquitetônicas correspondente ao gosto da Restauração, sem equivalente na Île-de-France até o momento.", exulta o curador. 

Yerres fica a cerca de 25 quilômetros de Paris, de forma que é muito fácil fazer um bate-e-volta para conhecer essa bela propriedade. Endereço: 8, rue de Concy, 91330 - Yerres. Tél. : 01 80 37 20 61 (Negócios Culturais do Patrimônio). O site está apenas em francês, mas, mesmo que você não entenda o idioma, vale a pena dar uma olhada nas belas imagens: www.proprietecaillebotte.com

O parque tem entrada livre e abre de segunda a domingo, mas possui horários de funcionamento diferentes, dependendo da época do ano. De 1º/6 a 31/7, auge do verão europeu, abre das 9h às 21h. Horários de visita à mansão: de 15/3 a 1º/11, terça a domingo, das 14h às 18h30. O ticket para a mansão custa 8 euros para adultos não residentes na cidade. Vai passar um tempo em Paris? Vale a pena dar uma esticada até lá e sentir, na pele, a atmosfera encantadora legada pelos Caillebotte!

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