quinta-feira, 16 de abril de 2015

'Mapas para as Estrelas'. Um retrato cru e bizarro da miséria moral de Hollywood.

Pense em um filme que só tenha gente pervertida, ou louca, ou má, ou tudo isso junto. Esse filme existe, chama-se 'Mapa para as estrelas' e é dirigido por David Cronenberg, canadense mais conhecido pelas esquisitices e pela estética um tanto bizarra de sua obra do que pela genialidade. Confesso que, quando li a sinopse e vi que a direção era dele, fiquei até com receio de assistir, mas o enredo pareceu-me interessante e o elenco conta com a grande Julianne Moore.

E é justamente uma atriz que ela interpreta em 'Mapa para as Estrelas'. Moore dá vida a 'Havana Segrand', uma artista decadente de Hollywood obcecada em obter um papel que havia sido interpretado por sua mãe quando jovem. A mãe, morta num incêndio, era uma estrela de sucesso que teria abusado sexualmente da filha e a traumatizou de maneira indelével. Havana tem visões em que a jovem e linda mãe volta para espezinhá-la e tenta curar seu trauma com umas sessões um tanto exóticas de psicoterapia com o Dr. Stafford Weiss, um psiquiatra famoso, rico e ambicioso que tem programa na TV e dois filhos que podem ser tudo, menos mentalmente normais.

A estrela cadente Havana Segrand (Julianne Moore) em sua mansão.

A atriz em uma sessão com o Dr. Weiss, um psiquiatra "pop star" 
e pai desalmado (John Cusack).

Um dos filhos do psiquiatra é Benjie Weiss, um astro mirim mimado, arrogante, frio e amoral que já passou temporadas em clínicas de reabilitação pelo uso de drogas, trata os fãs com desprezo e age como um sociopata. Pergunto-me em qual astro infantil – ou astros – o diretor se baseou para criar tal caracterização. Será um Justin Bieber da vida? Ou um Macaulay Culkin que, após alcançar o sucesso nos anos 90, cresceu e hoje amarga o mais absoluto ostracismo? Sim, porque ficamos com a nítida impressão de que o personagem foi baseado em crianças reais do meio artístico.

Benjie Weiss (Evan Bird), o astro mirim que virou aberração social.

Benjie tem uma irmã de dezoito anos, Agatha, que volta a Hollywood após anos internada em uma instituição psiquiátrica por ter ateado fogo na casa onde morava com os pais, supostamente para matar o irmão. Pois é, o tal psiquiatra tem filhinhos absolutamente "saudáveis"! (E cá entre nós, desconfio que esse tipo de situação seja mais comum do que se imagina: psicólogos e psiquiatras que negligenciam a própria cria e geram filhos infelizes e/ou francamente desajustados. Medo.) Voltando ao filme, a adolescente, cheia de cicatrizes físicas e morais, deseja reencontrar e obter o perdão dos pais que não querem vê-la nem pintada e conhece Jerome, um jovem motorista de limusine com pretensão a ator. A moça sente-se atraída pelo rapaz até que vai parar na casa de... Havana, para trabalhar como uma espécie de assistente pessoal da atriz. O que acontece depois é de arrepiar.

Agatha (Mia Wasikowska) e Havana, atriz vazia e traumatizada.

A todo momento, a opulência das residências, dos ambientes e das festas hollywoodianas contrasta de forma cortante e contundente com a miséria moral de seus personagens. Como já seria de se prever, o psiquiatra e pai das crianças, bem como sua esposa Christine, pouco se importam com o bem-estar dos filhos: desejam apenas evitar escândalos para que os produtores não deixem de contratar Benjie e os contratos milionários não rareiem. Havana, por sua vez, não tem o mínimo de seletividade e nem qualquer escrúpulo quando se trata de sexo, transando com quem aparece pela frente. Nem Jerome escapa, mesmo que ela soubesse que supostamente o moço seria namorado de Agatha, sua funcionária. Aliás, a forma como a atriz se refere à jovem após fazer sexo com o motorista é de um cinismo e insensibilidade atrozes.

A desequilibrada Agatha e Jerome (Robert Pattinson), o motorista de limusine que busca um lugar ao sol na terra dos sonhos.

Em suma, trata-se de um filme que choca pela absoluta ausência de meios-tons ou meias-palavras para mostrar um mundo idealizado no qual os astros e estrelas são, na realidade, verdadeiros buracos negros disfarçados. Para ser sincera, não gostei. Talvez não esteja preparada para tanta crueza e estranheza juntas, sei lá. Porém, a única impressão que restou foi a de choque. Se essa era a intenção do diretor, bingo. E se o estilo te agrada, vá assistir. Mas não diga que não avisei. 

Ficha técnica parcial

Direção: David Cronenberg

Elenco:
Julianne Moore (Havana Seagrand)
Robert Pattinson (Jerome Fontana)
John Cusack (Dr. Stafford Weiss)
Evan Bird (Benjie Weiss)
Mia Wasikowska (Agatha Weiss)
Olivia Williams (Christina Weiss, esposa de Stafford)

Nenhum comentário:

Postar um comentário