domingo, 20 de maio de 2012

Liszt no piano de Bertrand Chamayou com regência de Tugan Sokhiev. Puro êxtase na Sala São Paulo.

Quarta-feira tive uma experiência musical transcendental. Fui à Sala São Paulo especialmente para ouvir (e ver, e absorver, e sentir...) o Concerto nº 1 para Piano e Orquestra de Franz Liszt (1811-1885), em minha opinião um dos mais belos concertos para piano existentes nesse mundo – e provavelmente nos outros também. Sim, porque um concerto como esse tem o poder de nos transportar para outras dimensões, outras esferas, outros níveis de sensibilidade... enfim, para uma verdadeira viagem cósmica!!! Eu já estudei o bendito, e só Deus sabe como é difícil. Consumiu-me horas e horas de estudo de piano numa época em que eu nem sonhava em me tornar publicitária. Não por acaso, Liszt é conhecido também pelos desafios técnicos que suas obras impõem aos pobres – e abençoados - pianistas.

Por falar nisso, o compositor chegou à versão inicial desse concerto em 1849, depois de algum tempo de trabalho. Após revisá-lo várias vezes, alcançou a forma que considerou definitiva em 1855, quando a obra foi apresentada em Weimar com o próprio Liszt ao piano e Berlioz como regente. Fico imaginando o que sentiu a plateia naquele momento... queria ter estado lá!

Franz Liszt

Para quem não sabe, o húngaro Franz Liszt foi uma criança prodígio e encantou Viena e Paris com suas performances musicais. Como se não bastasse sua imensa virtuosidade ao piano, o homem era um gênio como compositor e ainda tinha um carisma e uma beleza física impressionantes. Dizem que as mulheres da época caíam a seus pés. Inovador, ele é que inventou o recital de piano como o conhecemos hoje, com o solista sozinho no palco tocando o instrumento. Liszt realmente nasceu "estrelado" e teve uma longa vida que soube conduzir de forma produtiva e feliz.

O gênio, mais maduro  

Do concerto a que assisti, não conhecia nem o solista, nem o maestro e nem a orquestra: o pianista francês Bertrand Chamayou, sob a batuta do russo Tugan Sokhiev no comando da Orchestre National du Capitole de Toulouse. No entanto, por se tratar de um concerto integrante da Temporada 2012 da Cultura Artística, as credenciais só podiam ser as melhores possíveis e fui assistir de olhos fechados. Não me enganei: o entrosamento entre pianista, maestro e orquestra foi perfeito e a plateia ficou hipnotizada. Dava para perceber que todos os intérpretes estavam à vontade e que se divertiam enquanto tocavam.

Do camarote superior onde me encontrava não dava para ver direito as fisionomias dos músicos e nem do maestro. Ao ler o programa, contudo, qual não foi meu espanto ao descobrir que o maestro tem apenas 35 anos de idade e o pianista 31??? Fiquei surpresa com a maturidade musical dos dois, sendo tão jovens.

A vista de nosso camarote... - Foto: Simone Catto

Chamayou interpretou o concerto de Liszt maravilhosamente bem (porém, arrisco dizer - talvez não com a força e o vigor de minha saudosa mestra, a pianista argentina Beatriz Balzi) e o maestro Sokhiev foi simplesmente brilhante. Estudou com renomados mestres russos, assumiu a orquestra de Toulouse com apenas 31 anos e já recebeu elogios rasgados da crítica especializada. Não só na França, mas em países como Áustria, Espanha, China, Japão, Rússia, Alemanha e Reino Unido. Já regeu a Filarmônica de Viena, a Filarmônica de Berlim e a Orquestra Concertgebouw de Amsterdã, entre muitas outras, tendo se apresentado em palcos como o La Scala de Milão e o Metropolitan de Nova York. Ufa!!! Um currículo e tanto para um regente de apenas 35 anos. Além disso, o jovem Sokhiev é de um carisma ímpar. Esses russos são mesmo impossíveis...

Tugan Sokhiev, o jovem maestro.

Bertrand Chamayou, o pianista, nasceu na própria cidade de Toulouse. Estudou no disputadíssimo Conservatório de Paris e, depois, em Londres, com a grande pianista italiana Maria Curcio. Jornais como o 'Le Figaro' e o 'Le Monde', na França, já teceram elogios rasgados ao rapaz. Segundo o catálogo do concerto, Chamayou é um dos pianistas mais requisitados de sua geração – seja como solista, recitalista ou músico de câmara. Já ganhou vários concursos de piano e tocou em salas como a Pleyel (Chopin se apresentou por lá), o Théâtre des Champs-Elysées e o Lincoln Center de Nova York, entre muitas outras. Esse tem uma grande carreira pela frente. Simpático, premiou o público com um bis impecável – uma peça também de Liszt cujo nome, confesso, ainda não sei.

Bertrand Chamayou, um excelente pianista.

Além do Concerto de Liszt que me levou até lá, a orquestra também interpretou, com grande brilho, a Abertura Kovantchina e Quadros de uma Exposição, ambas do russo Modest Mussorgsky (1839-81) e orquestradas por Ravel.

Ao final, maestro e orquestra foram longamente ovacionados e fomos presenteados com um maravilhoso bis: a famosa Abertura da ópera Carmen, do francês Georges Bizet (1838-75). Mais aplausos que não acabavam mais, e eis que ganhamos mais um bis super empolgante: a Dança Russa, da Suíte Quebra-Nozes, do russo Tchaikovsky (1840-93). Um gran finale para uma grande noite. Bravo!!!

Nem é preciso dizer que a Sala São Paulo é um espaço perfeito 
para concertos desse nível - Foto: Simone Catto

Chegamos cedo ao local e, enquanto aguardávamos o horário do concerto, tomamos uma taça de vinho apreciando o movimento - Foto: Simone Catto 

Em tempo: não achei nenhum vídeo de Chamayou na web interpretando o Concerto nº 1 para Piano e Orquestra de Liszt, mas achei a incrível performance de Lang Lang, o endiabrado chinês que você pode ver aqui acompanhado pela BBC Symphony Orchestra, sob regência de Edward Gardner no Royal Albert Hall de Londres. Detalhe: Lang Lang deve estar se apresentando agora na Sala São Paulo, com outro repertório. Ouça e babe.

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