quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Moustiers Sainte-Marie. A cidade que nasceu com a estrela.

No dia em que entrei de carro na cidadezinha de Moustiers Sainte-Marie, no Sul da França, fui logo olhando para o alto. Não, eu não estava procurando nenhum castelo, igreja ou outro monumento histórico no topo de alguma colina. O que eu procurava, em plena luz do dia, era uma estrela dourada. Uma grande estrela que reluz pendurada por uma corrente entre duas montanhas do lugarejo e é símbolo da cidade.


Como a estrela apareceu ali, ninguém sabe ao certo. Alguns falam de histórias de amor, de ideais da Cavalaria e até de episódios envolvendo os Reis Magos, mas a versão mais conhecida foi relatada por um certo Frédéric Mistral. Diz a lenda que um cavaleiro medieval chamado Blacas, prisioneiro dos sarracenos à época das Cruzadas, prometeu à Virgem Maria erguer uma estrela nos céus de Moustiers caso fosse libertado. E assim se fez, para a glória do cavaleiro e a nossa alegria, quase dez séculos depois. 

Foto: Simone Catto

Note a estrelinha pendurada entre as duas montanhas na foto acima. A título de curiosidade: ela tem cinco pontas, é folheada a ouro e seu tamanho variou, ao longo da história, de 30 a 180 cm, até os 125 cm atuais. A corrente que a sustenta tem 135 metros de comprimento e pesa 150 kg.

Não por acaso, desde 1981 Moustiers Sainte-Marie foi classificada como uma das mais belas cidades da França. Capelas medievais, desfiladeiros, o aqueduto, as muralhas e fontes tornam o lugar realmente encantador, sem falar da abundância de água e de um sol que brilha cerca de 300 dias por ano. A paisagem é mesmo de tirar o fôlego.


Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

Preservada com todo o cuidado e carinho por seus cerca de 700 habitantes, a cidade apresenta traços de ocupação humana que remontam a cerca de 30.000 anos a.C., mas somente no século V começou a ser habitada de maneira mais ordenada pelos monges da abadia de Lérins, que ali fundaram um monastério. Daí o nome "Moustiers" ("monastério", na Idade Média).

A capela de Notre-Dame de Beauvoir, construída no fim do século XII no local de um templo cristão que já existia em 470 d.C, mostra o caráter sagrado da cidade, que ao longo dos séculos foi importante local de peregrinação.

Capela de Notre-Dame de Beauvoir - Foto: Simone Catto

Nos séculos X e XI Moustiers sofreu a invasão dos mouros, mas começou a se recuperar já nos séculos XII e XIII, quando casas e fortificações foram edificadas e vários moinhos de água instalados ao longo do rio Adou. A água, um recurso natural abundante e onipresente na região, contribuiu enormemente para a economia da cidade ao longo dos séculos - graças a ela, no séc. XVI várias indústrias movidas a energia hidráulica instalaram-se no local. Após um breve período "negro" no início do séc. XVII, ainda no mesmo século Moustiers assistiu a um grande boom na produção de cerâmica, conquistando fama mundial.

Foto: Nicolas Janberg
 
Construído sobre o rio Adou para distribuir água aos moinhos locais, o aqueduto é hoje um testemunho histórico dos sistemas de irrigação de outrora.

As falésias sobre as quais a cidade foi erguida e aquelas que a circundam constituíam uma defesa geográfica natural, mas Moustiers também construiu muralhas para se proteger, assim como tantas outras cidades da Idade Média.

Foto: Jacques Ste-Marie

Como toda cidadezinha tipicamente medieval, as ruelas de Moustiers estão repletas de belas fontes de água potável onde os homens e animais iam se refrescar e as mulheres lavavam roupas.

Fonte ao lado da capela de Notre-Dame de Beauvoir - Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

A economia da cidade se articula em torno do turismo e da produção de cerâmica, uma tradição que teve início já na Idade Média, mas ganhou impulso com um homem chamado Pierre Clérissy, a quem um monge italiano de passagem pelo Monastério da Comunidade de Lérins confiou o segredo da produção do esmalte branco, no ano de 1668.

Quando Luís XIV, o "Rei-Sol", ordenou que toda louça de ouro e prata fosse fundida para reforçar o tesouro real, a Europa toda se voltou para a cerâmica de Moustiers, que ganhou fama internacional e teve seu auge. Essa produção só seria interrompida no início do século XIX, quando a porcelana inglesa virou moda.

Em 1927, um cidadão local chamado Marcel Provence acendeu novamente um forno de cerâmica na cidade, numa tentativa de reavivar sua imagem de grande produtora mundial. Tudo bem que a cerâmica de Moustiers não recuperou a glória de outrora, mas o esforço não foi em vão: atualmente a cidade conta com cerca de vinte ateliês que mantêm acesa a tradição.

Foto: Marie, Julian e Laurent Thomas

Um charmoso comércio se espalha pelas ruelas do lugar, incluindo as lojas de cerâmica e iguarias da região, tais como queijos, trufas, biscoitos, tapenade, o mel de lavanda e seu famoso azeite de oliva. Moustiers, aliás, tem mais de 20.000 oliveiras. Os gourmets podem experimentar tudo isso em cerca de vinte restaurantes que agradam desde os amantes de uma deliciosa comida caseira até a gastronomia mais refinada.

Foto: Jacques Ste-Marie

Foto: Baloulumix

Como visitei a Provence no outono, não tive a oportunidade de ver a beleza dos campos de lavanda roxinhos, como na foto acima. Fica para a próxima! A lavanda, típica da região, é utilizada na fabricação de sabonetes e cosméticos, além de possuir propriedades terapêuticas. Confesso que o mel de lavanda, embora de sabor mais leve que o nosso, não me agradou tanto quanto as variedades de mel que temos por aqui. Questão de paladar, peut-être...

A belíssima paisagem de Moustiers e sua topografia privilegiada também atraem a moçada que aprecia esportes radicais. Situada no início dos desfiladeiros do Verdon, um dos canyons mais profundos da Europa (chega a atingir 700 m de profundidade), a cidade está integrada ao Parque Natural Regional do Verdon, onde se é possível praticar trilhas, escalada, rafting, equitação, esportes náuticos e até voo de parapente. Se você não for chegado a esportes radicais, não deixe de fazer pelo menos uma trilha para sentir as cores e aromas da natureza da Provence.

Foto: Jacques Ste-Marie

Foto: Jacques Ste-Marie

Foto: Jacques Ste-Marie

Deu para entender por que eu não só amei como pretendo voltar a Moustiers Sainte-Marie? Se você também se apaixonou pela cidadezinha estrelada, vale a pena dar uma olhada no site oficial de seu Escritório de Turismo: http://www.moustiers.fr/. Você pode visualizá-lo em francês e inglês. Está dada a dica!

Conheça outras cidades encantadoras da Provence, em: 

-Aix-en-Provence. Arte e cultura direto da fonte.

-Cagnes-sur-Mer. Lar, ateliê e inspiração de Renoir.
-Cotignac. Para fazer as pazes com o tempo.

2 comentários:

  1. Querida Amiga Simone
    Fantástico!!
    Hoje, dediquei um tempo para retornar ao teu blog. As últimas postagens dão vontade de largar tudo, pegar um avião e ir visitar cada um desses lugares da Provence. Mounstiers Saint-Marie em especial. Maravilhoso. Um encanto de cidade.Valeu.
    Continue enriquecendo seus amigos com suas matérias. Texto impecável. Nos leva a viajar..
    Beijos
    Nunes, Nilma e Maria Clara - S.A.Pinhal

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  2. Olá, amigos!! Obrigada pelo comentário! Fico feliz em ver que estão conseguindo "viajar" um pouco no meu blog! rs... Após ter vivenciado tantas coisas boas nessa viagem, o mínimo que eu poderia fazer é compartilhá-las com pessoas como vocês, que apreciam a arte e valorizam a cultura. Depois vou inserir posts também sobre a Itália, aguardem! Um grande abraço!

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