quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Oppède-le-Vieux: história congelada em beleza e paz.

Andar, respirar, subir, contemplar, voltar, olhar de novo, suspirar... essa foi minha reação ao visitar Oppède-le-Vieux, uma vila medieval de 1.400 habitantes no flanco norte do Lubéron, na Provence francesa. Empoleirada no topo de um rochedo invadido por vegetação, em meio a um cenário de florestas selvagens, aclives e ruínas, a vilinha tem uma atmosfera mágica com seu silêncio secular e suas estruturas de pedra que sobem pelas escarpas.

Tudo bem que cidades e villages com maior ou menor número de resquícios medievais estão espalhados por praticamente toda a Provence, mas esse me atraiu de maneira particular. Logo ao estacionar o carro, no pé da colina, já deu para perceber que não se tratava de um lugar comum. O único ruído que eu ouvia era o canto dos pássaros. Não havia turistas. Aliás, não havia praticamente ninguém, o que achei maravilhoso. Ao olhar para o rochedo, já visualizei as antigas ruínas de pedras, a igreja do século XII no cume e o que sobrou do castelo feudal, tudo misturado à vegetação. Na foto abaixo, vemos a antiga igreja no alto, à esquerda, e as ruínas do castelo, logo à sua direita.

Foto: Simone Catto

Comecei a subir a pé, seguindo as placas. A esse respeito, vale dizer que, apesar de minúsculo, o vilarejo é bem sinalizado.

Foto: Simone Catto

Em determinado momento, topei com um painel de azulejos coloridos formando um mapa da região. Ao ler a inscrição, descobri que foi criado pelas crianças da escola de Oppède, em junho de 1995, e reproduzido na cerâmica em abril de 1998. Fiquei encantada com a iniciativa. Do jeito que os franceses são nacionalistas, não é de admirar que incutam nas crianças, desde cedo, o senso de civilidade e de pertencimento.

O painel de cerâmica criado com base no desenho das crianças locais - Foto: Selma

Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

A subida pela colina é irregular, não acontece em linha reta. A cada patamar, um lance de escadas de pedra nos conduz a uma nova clareira. E a cada clareira, eu parava, respirava e contemplava a paisagem, encantada.

Foto: Simone Catto

Como diria uma amiga querida... vamos sentar e conversar? - Foto: Simone Catto

Finalmente, cheguei ao centro do Vieux Village, a Cidade Velha. Estava igualmente deserta, à exceção de um casal de ciclistas aventureiros e de outro que passeava com uma criancinha. Parênteses: a região da Provence tem muitos ciclistas, sejam pessoas que utilizam a bicicleta como meio de transporte (e isso inclui gente dos 9 aos 90 anos), sejam esportistas que levam o ciclismo a sério e pedalam por quilômetros. Se por um lado a disposição dos franceses é invejável, por outro é perfeitamente compreensível! Como não ter fôlego em um cenário como esse?  

A praça central de Oppède, pura paz! - Foto: Simone Catto
 
Detalhe do sino da praça - Foto: Selma
 
Neste ângulo da praça, podemos ver um mapa da cidade - Foto: Simone Catto

Ainda a praça... - Foto: Simone Catto

O restaurante da praça ainda estava fechado porque era cedo, mas dali a pouco abriria para receber os poucos turistas, já que o verão ainda não estava no auge.

Foto: Selma

As estruturas intramuros de Oppède foram estabelecidas no início da Idade Média e o traçado atual das ruas remonta àquela época, mas os primeiros registros de ocupação humana no local são bem mais antigos, do período romano.

Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

À medida que subia pelos caminhos e pavimentos de paralelepípedos, parecia que eu estava sendo transportada a outra dimensão.

Foto: Selma

Foto: Simone Catto

Em alguns momentos da caminhada, deparei com grutas escavadas nas rochas, as quais abrigavam antigas residências e estabelecimentos comerciais.

 Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

Após pertencer a diversos senhores feudais, Oppède tornou-se propriedade papal em 1274, assim que os papas se instalaram em Avignon. A partir dali, transformou-se em um burgo importante que dialogava com outros dois importantes feudos da vizinhança, Apt e Cavaillon. Ostentando orgulhosamente seu castelo e sua igreja no topo da colina e defendida por suas muralhas, a vila teve sua época de maior prosperidade no século XIV, quando contava então com 900 habitantes.

Foto: Simone Catto

Uma característica interessante do lugar é que as primitivas construções medievais às vezes são entremeadas por casas do século XV, já do final da Idade Média, e do século XVI, início da Renascença. Muitas vezes, deparamos com esses diferentes estilos lado a lado, o que torna o cenário ainda mais pitoresco. A foto abaixo, que parece mostrar uma construção do século XVI apoiada sobre uma base de pedras medievais, retrata bem essa integração de gêneros arquitetônicos.

Foto: Selma

Vez ou outra, eu topava com algumas dessas residências renascentistas restauradas e transformadas em charmosas pousadas, restaurantes ou casas de veraneio. Soube, inclusive, que alguns artistas, escritores e outras celebridades, os quais compreensivelmente preferem manter o anonimato, adquiriram propriedades na região com esse fim.

Ao olhar a figurinha esculpida em metal pendurada à entrada da casa, na foto abaixo, pensei se tratar de um restaurante, mas era, na verdade, uma hospedaria. Na França, as pessoas podem alugar para turistas até cinco quartos por habitação particular - são os chamados chambres d'hôtes, ou "quartos para hóspedes". Achei esta uma graça, ainda mais com as lavandinhas floridas ao lado da porta.

Foto: Simone Catto

Um outro aspecto curioso que constatei não apenas em Oppède, mas em outros lugarejos da Provence, são seus resquícios de religiosidade: não raro, algumas residências têm a parte externa ornamentada com santos e crucifixos. No exemplo da foto a seguir, novamente temos uma união "erótico-arquitetônica" entre dois estilos: a construção cor-de-rosa, mais moderna, literalmente se agarrou à outra com estruturas aparentemente medievais, à sua esquerda, e parece que não vai soltar tão cedo. O santo entre ambas, coitado, finge que não vê essa "pouca-vergonha", rs.

Duas construções contrastantes em flagrante ato libidinoso
e o santo que faz vista grossa, rs - Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

Acredito que em Oppède a presença desses sinais de religiosidade se justifica de maneira especial porque a vila foi propriedade dos papas de Avignon. Por falar nisso, vamos agora para o alto do rochedo entrar na igreja Notre-Dame D'Alidon, uma das poucas edificações antigas que não estão em ruínas. Originalmente construída no século XII, no estilo românico, a igreja foi reformada a partir de 1500, ganhou traços góticos em 1592 e foi restaurada em 1815 e 1869. Atualmente está novamente em reforma, com o patrocínio de doadores particulares. Sim, muitos ricos que moram na França contribuem para a preservação do patrimônio e certamente recebem incentivos para isso. 

A foto do altar da igreja Notre-Dame d'Alidon saiu meio desfocada, mas dá para ter uma ideia da beleza de seu interior restaurado - Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

A vista lá de cima é fantástica e tive um momento único de "embasbacamento" turístico-existencial.

Foto: Selma

Se eu voltaria a Oppède-le-Vieux? Sim, um milhão de vezes. À la prochaine!

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