Amedeo Modigliani - repare na postura desafiadora do moço. |
Amedeo Modigliani - Madame George van Muyden (1916-8) - óleo s/ tela Esta obra faz parte do acervo do MASP. |
Filho de judeus sefarditas,
Modigliani nasceu na cidade italiana de Livorno. Era um criança muito bonita, porém
frágil e doentia. Sua mãe, mulher culta e viajada, trabalhou como intérprete para
ajudar nas despesas quando o marido faliu. O pai era ausente. Assim, o menino
cresceu num ambiente de pobreza, mas intelectualmente estimulante. Em 1898, aos
14 anos, matriculou-se na escola de arte de Guglielmo Micheli, mas, cerca de dois
anos depois, viajou para Florença e Veneza, onde fez vários amigos e estudou
mestres como Bellini e Ticiano. Em 1901, chegou a escrever a um amigo: 'Pessoas
como nós têm direitos diferentes dos demais, pois temos necessidades que nos
colocam... acima da moral comum'. 'Pouco' pretensioso, o moço...
Retrato de um homem de bigode (1900), óleo s/ tela Modigliani tinha apenas 16 anos quando fez essa pintura: ele já mandava bem! |
Em 1906, 'Modi' finalmente parte
para Paris, como fazia qualquer artista que se prezasse. Lá levou uma vida
boêmia e totalmente desregrada, bebendo e se drogando em bares e bordéis. Não
podia dar outra: o dinheiro enviado pela mãe acaba e ele começa a pagar as
dívidas com seus quadros. Em Paris conheceu gente do calibre de Picasso, Juan
Gris, Utrillo, Fujita e Moïse Kiling, entre outros, e escritores como
Apollinaire e Max Jacob. Seus pontos de referência? O cabaré Le Lapin Agile e espeluncas como esse café que você vê abaixo.
Não tinha jeito: o homem adorava um basfond. |
Maurice Utrillo - Le Lapin Agile (1912) - litografia aquarelada |
Moïse Kisling - Ateliê de Kisling com uma escultura de Modigliani (1918) - óleo s/ tela |
Modigliani morou durante um
tempo em La Ruche (A Colmeia), um edifício circular que abrigava cerca de 80
artistas, onde dividiu um quarto com Chaïm Soutine e outro pintor. Quem pagava
suas despesas era o marchand Paul Alexander, mas o artista foi expulso quando, ao
brigar com um dos colegas de quarto (não Soutine, o outro), destruiu as obras
do coitado. Enfim, ele era um 'amor' de pessoa!...
La Ruche ('A Colmeia'): o artista morou aqui até aprontar mais uma das suas. |
Em 1907, Modigliani visitou uma
exposição póstuma de Cézanne e ficou encantado. Influenciado pela obra do
mestre e fascinado pela forma, começa a fazer esculturas e encontra o escultor
Constantin Brancusi, que lhe dá aulas de graça. As esculturas de Modigliani
lembram as máscaras africanas, tão em voga na época. No entanto, ele não
conseguiu se tornar escultor porque não tinha saúde e nem dinheiro para comprar
o material necessário. Dizem que chegou, inclusive, a roubar pedras das ruas de
Paris para executar seus trabalhos. (Em tempo: segundo o prof. Renato Brolezzi, do MASP, existem muitas esculturas falsas de Modigliani por aí!).
Escultura em bronze a partir de original de Modigliani. |
Mesmo com esse gênio 'do cão',
não faltaram anjos da guarda na vida de Modigliani. A partir de 1916, o anjo
apareceu na figura do empresário Léopold Zborowski, que chegou a percorrer as
ruas de Paris oferecendo suas telas a eventuais interessados. Contudo, por ser antissocial
e mal participar de exposições, o artista vendia pouco.
Para Modigliani, tudo nascia da linha, do desenho. E as
figuras geométricas estão sempre lá, subjacentes, marcando cada bloco pintado.
Modigliani - Jovem Mulher (1917) - óleo s/ tela |
Conhecido por seus retratos e pelos maravilhosos
nus, Modigliani é, paradoxalmente, o pintor da 'constância', da 'permanência'.
Tanto é verdade, que nem sua obra mudou ao longo de sua vida. Suas cores são
comedidas, suavemente interligadas: não existem embates cromáticos. Para ele, o
que importava era o tempo imaterial, não o tempo vivido. Um tempo fixado nos semblantes plácidos e serenos dos retratos. Os movimentos, quando existem, são contidos.
Seus retratados sempre têm o olhar vazio, olhando para o nada. Neles não
existem 'paixões' - ao contrário da ebulição e do caos aboluto que eram sua vida. À custa de muito sofrimento, 'Modi' conseguiu, portanto, abstrair,
sintetizar e 'depurar a singularidade das emoções', conforme observou o prof.
Renato Brolezzi no curso de história da arte que tive sábado no MASP.
Modigliani - Jovem Mulher de Olhos Azuis (1917) - óleo s/ tela |
Modigliani - Grande Figura Nua Deitada (Céline Howard) (1918) - óleo s/ tela - Os nus de Modigliani são soberbos! |
Arriscando uma psicologia de
botequim, é como se o artista tentasse, por meio da obra, dar uma ordem a seu
furacão interior. Um furacão que arrastou uma sucessão de amantes, incluindo a
poetisa russa Anna Achmatova e a jornalista sul-africana Beatrice Hastings, a
qual conheceu em 1914 e com quem manteve uma relação tempestuosa. Consta que,
certa vez, ele atirou Beatrice pela janela e, em outra ocasião, ela lhe mordeu
os testículos. Fofos, não??...
Em julho de 1917, 'Modi' conheceu outro anjo: a bela e doce Jeanne Hébuterne, jovem e talentosa aluna da
Academia Colarossi. Ele pintou dezenas de retratos da moça, que, certa vez,
escreveu a um amigo algo como: "Prefiro ficar aqui posando para ele - pelo
menos assim ele está em casa, junto de mim!"
A linda e meiga Jeanne Hébuterne... essa deve ter ido para o céu!!! |
Modigliani - Jeanne Hébuterne com lenço (1919) - óleo s/ tela |
Jeanne deu a Modigliani uma filha que ganhou o mesmo nome da mãe. O relacionamento dos dois foi tão conturbado quanto o anterior e repleto de violência. No entanto, ao contrário de Béatrice, Jeanne era tímida, retraída, venerava o artista e suportava com resignação seus maus-tratos.
Jeanne Hébuterne - O Quarto de Marie (1917) óleo s/ tela - A menina também tinha talento! |
Nessa época, embora Modigliani
já estivesse vendendo alguns quadros, o generoso Zborowski lhe dava uma pequena
mesada e, em abril de 1918, financiou a viagem de um grupo de artistas – entre
eles Modigliani e Jeanne – para o sul da França, para que ele pudesse trabalhar
num ambiente saudável. E lá se foram o casal e o amigo Soutine para
Cagnes-sur-Mer.
Uma vida tão errática e
insalubre só poderia resultar em tragédia. Modigliani morreu doente em Paris, com
apenas 35 anos, em 24 de janeiro de 1920. Jeanne suicidou-se no dia seguinte,
aos 21 anos e grávida de 8 meses, atirando-se do quinto andar do apartamento do
casal. Hoje repousam lado a lado no cemitério de Père Lachaise. A
filha do casal, Jeanne (1918-84), foi adotada pela irmã do artista, Margherita,
e em 1958 escreveria uma importante biografia do pai: 'Modigliani, o homem
e o mito'.
Amedeo Modigliani em seu ateliê. |
A exposição ‘Modigliani – Imagens de uma Vida’ fica no
MASP até 15 de julho e está dividida em quatro blocos:
1- A formação na Itália – 1884-1905
2- A experiência parisiense –
1906-1916
3- O interlúdio da escultura –
1906-13
4- Consolidação estilística –
1917-20
Na realidade, a exposição não
tem tantas obras do artista como seria de se supor. Elas dividem espaço com obras produzidas
pelos professores, amigos e outros artistas que o influenciaram. De qualquer modo, é uma
exposição importante que merece ser vista.
MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO
Av. Paulista, 1.578. Tel.: (11) 3251-5644. Site: www.masp.art.br. Abre das 11h
às 18h às terças-feiras, domingos e feriados, e das 11h às 20h às quintas. A bilheteria fecha meia hora antes. Ingressos: R$ 15,00 e
R$ 7,00 (estudantes, professores e aposentados com comprovante). Entrada franca
às terças-feiras e todos os dias para visitantes até 10 anos e acima de 60.
adorei o post e fiquei morrendo de vontade de conferir a exposição!!
ResponderExcluirbjo
Com certeza você vai gostar, Renata!
ResponderExcluirE ainda pode conferir as outras exposições do Masp. Bjs!