Uma
cidade não é só aquilo que vemos. Ela é um conjunto de símbolos e também das
sensações que suscita em nós. Existe um artista que sabe, como ninguém,
traduzir em suas telas a São Paulo que habita o inconsciente de muitos
paulistanos por nascimento ou por opção.
Estou
falando de Gregório Gruber,
desenhista, pintor, gravador, escultor, fotógrafo e, ufa!... cenógrafo. O fato
é que, embora domine – e com a mais absoluta mestria - uma série de técnicas, o artista ficou conhecido mesmo pelas pinturas e pastéis que
retratam paisagens da cidade de São Paulo. Mas não a São Paulo do caos, da
poluição visual, do trânsito e das multidões. A São Paulo de Gregório é
deserta, serena, uma cidade meio onírica. É a paisagem que visualizamos quando
acordamos no meio da madrugada para beber um copo de água e abrimos a janela do
apartamento para dar uma espiadinha. Vemos tudo quieto, tranquilo, em silêncio.
Quando muito, avistamos uma luzinha acesa no apartamento do outro lado da rua e
pensamos: “Quem está acordado a essa hora?”... e então voltamos para a cama
para retomar o sonho de onde paramos. Um sonho que poderia muito bem ter como cenário uma pintura de Gregório Gruber.
Costumo
dizer que ele transforma "lugares de passar" em "lugares de estar". Viadutos e avenidas de São Paulo, locais onde a
vida pisa no acelerador, tornam-se paisagens
de acolhimento. São Paulo um dia foi assim. Até a década de 30, era uma
cidade para ser vista de perto, pelas pessoas que caminhavam nas calçadas e
podiam observar os detalhes da arquitetura urbana. As transformações da cidade
a partir daí, sobretudo na década de 60, época da infância do artista,
alteraram a natureza de suas experiências e a forma como ele percebia a metrópole.
Surgiram autopistas de grande velocidade como o elevado Costa e Silva - o amado-odiado "Minhocão" - e o habitante de São Paulo tornou-se um passageiro em permanente
movimento, passando a enxergar uma rápida sucessão de fachadas que perderam
espessura sob o impacto da velocidade.
Nas
telas de Gregório, as fachadas adquirem relevo e densidade, contrapondo-se à
volatilidade da arquitetura urbana. Seus viadutos e avenidas, que originalmente
seriam lugares de passagem, tornam-se lugares onde o olhar pode se deter e
repousar. Sempre digo que a velocidade aprisiona
e a desaceleração liberta. Porque ao desacelerarmos, damos à nossa mente o
tempo necessário para a apreensão e a percepção da realidade visível e,
principalmente, daquela que é invisível. É por isso que essas passagens urbanas
plácidas, apaziguadoras, assemelham-se às paisagens que observamos através de
uma janela na madrugada, libertando nosso pensamento para voar em outras
paragens.
As
obras abaixo ilustram muito bem essa percepção de passagens que substituem a
velocidade pelo acolhimento do olhar. Na primeira, uma pintura sobre juta, as nuvens da madrugada se dissipam e os
primeiros raios de sol iluminam a avenida ainda deserta. As demais são carvões e gravuras nas quais o artista transforma diferentes - e algumas icônicas
– vias da cidade em paisagens plácidas que convidam à contemplação.
Gregório Gruber - 'Passagem' (2008) - pintura s/ juta - 70 cm X 100 cm |
E
aqui o nosso "Minhocão", o feio mais amado de São Paulo, ganha outra dimensão
e uma perspectiva mais humana...
Gregório Gruber - desenho a carvão (2007) - 70 cm X 100 cm |
Gregório Gruber - desenho a carvão (2007) - 70 cm X 100 cm |
Gregório Gruber - gravura (2004) - 57 cm X 78 cm |
Gregório Gruber - desenho a carvão (2007) - 70 cm X 100 cm |
Gregório Gruber - desenho a carvão (2007) - 70 cm X 100 cm |
Gregório Gruber - gravura (2004) - 57 cm X 78 cm |
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