quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Artistas esquecidas do Modernismo vienense ressuscitam no Belvedere.

Fonte: The Art Newspaper

Quando pensamos na arte de Viena da virada do século XIX para o século XX, período modernista, inevitavelmente lembramos de nomes como Gustav Klimt e Egon Schiele. O que muita gente não sabe, porém, é que várias mulheres fizeram arte no período. E das boas. Teresa Feoderovna Ries (1874-1950) foi uma delas. Judia nascida na Rússia, fez várias esculturas de nus, incluindo uma que causou escândalo ao ser apresentada em 1896: uma bruxa cortando as unhas dos pés. A ousadia, que lhe valeu muitas manifestações de asco e desprezo, rendeu também um convite de Gustav Klimt, o mais festejado artista austríaco de então, para exibir seu trabalho na aclamada Secessão de Viena, polo da vanguarda artística e também de uma parcela deliciosamente iconoclasta da elite local. Teresa foi uma das muitas mulheres libertárias do período que se aventuraram num métier predominantemente masculino, ajudaram a moldar o Modernismo vienense e, após décadas de atraso, finalmente começam a sair da sombra.

Teresa Feoderovna Ries - 'A Bruxa', c.1895
Literalmente transgressora da cabeça aos pés.

A escultora Teresa Feoderovna Ries, retratada com
um figurino igualmente arrojado.

O Palácio Belvedere, que adquiriu vários trabalhos de Teresa à época, está prestes a inaugurar a exposição 'Cidade de Mulheres', com obras de 50 artistas mulheres que, até então, têm tido suas trajetórias mergulhadas na obscuridade. Estarão lá a pintora de paisagens Tina Blau (1845-1916), que retratou cenários urbanos e campestres com pinceladas delicadas e grande maestria de cor, e a vencedora do Prêmio do Estado Austríaco de 1928, Helene Funke (1869-1957). "Elas alcançaram um nível de emancipação que foi completamente esquecido", afirma a curadora da exposição, Sabine Fellner. "Essas mulheres não tinham permissão para estudar na academia, então algumas foram estudar no exterior e se organizaram em clubes para expor [...] às vezes nas melhores galerias." Imagino que não devia ser fácil ser mulher à época, a menos que ela nascesse no seio de uma família de mente mais arrojada e um espírito cuja visão de mundo transcendesse as camadas banais do cotidiano.

Helene Funke - 'Sonhos', 1913 (provavelmente óleo s/ tela)

Helene Funke - 'Natureza morta com pêssegos', 1918 (provavelmente óleo / tela)

Não sabemos se as pinturas abaixo, de Tina Blau, serão expostas no Belvedere, mas dão uma boa ideia do talento e do estilo delicado da artista. A segunda é particularmente encantadora e mostra o imenso parque do Prater, em Viena, famoso pela sua roda-gigante.

Tina Blau - 'Vista de Viena a partir do Belvedere Superior', 1894-5, provavelmente óleo s/ tela

Tina Blau - 'Primavera no Prater', 1892 - Palácio Belvedere

Depois de 1945, essas artistas simplesmente desapareceram das vistas do público. Historiadores da arte do pós-guerra estavam muito mais interessados ​​em seus colegas masculinos mais famosos, sem falar que muitas haviam emigrado durante o período nazista. As judias fugiram ou foram deportadas.

Foi somente após a publicação do livro 'Mulheres artistas em Viena de 1897 a 1938', de Sabine Plakolm-Forsthuber, em 1994, que o interesse ressurgiu. Fellner diz que outro marco importante foi o livro de 2012 de Julie Johnson, 'A fábrica da memória: as esquecidas mulheres artistas da Viena de 1900'. Fiquei com vontade de ler ambos!

Preparar a exposição exigiu uma imersão profunda dos curadores nos depósitos do Belvedere para redescobrir obras, algumas das quais tidas como perdidas para sempre. Entre elas está a escultura 'Eva', de Teresa F. Ries, que não é exibida há décadas. "Também visitei descendentes das artistas para descobrir se ainda tinham obras de suas avós no porão ou no sótão", diz Fellner. Comerciantes de arte, que não são bobos nem nada, também a ajudaram a encontrar peças, possivelmente de olho em futuras oportunidades de vendas.

Fellner espera que o Belvedere também monte outras exposições individuais de artistas femininas da época, já que 'Cidade de Mulheres' apresentará apenas uma média de duas obras por artista. A bem da verdade, ela preferiria que a exposição tivesse sido montada em 2018, ano em que foram comemorados centenários importantes no país, como o da república austríaca e das mortes de Klimt e Schiele. Como isso não foi possível, a exposição chega agora. Antes tarde do que nunca!

A exposição 'Cidade de Mulheres' é patrocinada pela casa de leilões Dorotheum e estará no Palácio Belvedere de Viena de 25/1 a 19/5/19.

Nenhum comentário:

Postar um comentário