E como essa montagem veio parar aqui?
Tudo começou quando o diretor André Pink, que residia em Londres desde 1996,
recebeu, em 2011, um convite para dirigir o trabalho de uma turma da EAD - Escola de Arte Dramática da USP. O Homem Feio foi um dos textos
escolhidos pelo grupo.
O espetáculo conta a história de
Lette, um homem extremamente feio que vive bem com a esposa e não se dá conta
de sua feiura. Até que, um dia, acaba sendo preterido no trabalho por causa de
sua aparência: seu assistente é convidado a apresentar, num importante congresso,
um trabalho que ele havia desenvolvido com sucesso. Inconformado, Lette resolve
fazer uma cirurgia plástica. E fica tão bonito, mas tão bonito, que sua esposa
e seus colegas nem o reconhecem mais. Lette não só vai para o congresso
apresentar seu trabalho como passa a apresentar também os trabalhos dos colegas.
Os convites não param, e as mulheres fazem até fila para falar com ele ao final
de cada apresentação. Lette vira uma celebridade e sua personalidade também se
transforma: ele fica cada vez mais arrogante, narcisista e ambicioso. Creio que
qualquer semelhança com "O Retrato de Dorian Gray", de Oscar Wilde, não seja
mera coincidência!...
Só que ocorre uma reviravolta. Devido
ao sucesso da cirurgia realizada em Lette, o cirurgião plástico resolve aplicar
a mesma técnica em outros pacientes, gerando vários "clones" seus. E a
partir do momento em que deixa de ser "único", ou "novidade", Lette
passa a ser novamente preterido e cada vez mais relegado a segundo plano, entrando
em decadência. O homem começa então a se dar conta de que nos tempos de "feiura" era mais feliz e procura novamente o cirurgião plástico, desta vez
para "reverter" a cirurgia e recobrar seu antigo rosto. Mas aí já era tarde
demais.
Alex Houf e Bruna Miglioranza, que interpretam Lette e sua bela esposa. |
Com ótimos atores e tiradas irônicas
e divertidas, a peça critica determinados valores da sociedade contemporânea,
como o culto à beleza desprovida de significado e a fabricação em série de subcelebridades. A meu ver, o surgimento dos "clones" de Lette pode ser interpretado como uma crítica às cirurgias plásticas que pasteurizam o resultado e deixam todos os pacientes com a mesma "cara". E sobretudo, O Homem Feio mostra
como cada vez mais as pessoas perdem sua essência, afastando-se de valores que
possam conduzir à verdadeira felicidade.
Ficha técnica parcial:
Duração: 80 minutos
Texto: Marius von Mayenburg
Direção e Cenografia: André Pink
Assistente de Direção: Otavio Oscar
Elenco: Alex Houf, Bruna Miglioranza, Camilo Chaden, Danilo
Gambini, Fernanda Hartmann e Tiago Real
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