domingo, 19 de maio de 2013

'Lady Warhol', no MAM. Quando a mística é mais forte que a imagem.

Outro dia fui ao MAM ver a exposição do Alex Vallauri, precursor do grafite no Brasil, e aproveitei para dar uma olhada também na mostra 'Lady Warhol' - pela curiosidade, e também para descobrir por que ela ganhou cotação máxima no Guia da Folha, quatro estrelinhas.

Foto: Simone Catto

A exposição é composta de 50 fotos de Andy Warhol caracterizado como mulher, clicado em 1981 por seu amigo Christopher Makos, assistente de Man Ray na década de 70. Makos e Warhol eram mesmo muito próximos. Frequentavam as mesmas rodas, cultuavam os mesmos ídolos – Duchamp, Dali e Man Ray - e tornaram-se grandes parceiros intelectuais e companheiros de trabalho. Entre o final dos anos 70 e início dos 80, viajaram juntos pela Europa toda com suas respectivas câmeras, fotografando o que viam pela frente e também fazendo retratos de esposas e famílias ricas para "pagar o aluguel", como afirma Makos no catálogo da exposição. 'Costumávamos chegar a Paris a bordo do Concorde, então íamos para o apartamento dele na Rud du Cherche Midi, depois jantávamos comida italiana e daí, no dia seguinte, podíamos pegar um avião para a Alemanha', explica.


Makos explica também que as fotos fazem parte de uma série batizada de Altered Image, inspirada em retratos que Man Ray fez em 1921 do artista plástico francês Marcel Duchamp caracterizado como mulher, usando vestido e chapéu femininos. Na ocasião, a personagem do mestre dadaísta-surrealista interpretada por Duchamp foi batizada de 'Rrose (sim, com dois 'erres') Selavy'. No entanto, ao invés do clima noir da foto de Duchamp, Makos optou por uma abordagem diametralmente oposta, isto é, explorar ao máximo os efeitos da extrema brancura de seu modelo.


Marcel Duchamp caracterizado como a estilosa
dama noir 'Rrose Selavy', clicado por Man Ray.

Foto: Simone Catto

Warhol aparece com um figurino um tanto dúbio: posou de camisa branca, gravata e jeans, porém usando uma pesada maquiagem e diferentes perucas femininas. Vale ressaltar que o jeans, a camisa e a gravata, mais botas de caubói, faziam parte do figurino do artista no dia a dia. Além disso, em boa parte das fotos Warhol aparece com o "olhar perdido" das senhoras ricas que fotografava para ganhar a vida, numa espécie de paródia a arquétipos recorrentes em sua trajetória profissional.

Makos destaca ainda que, no final da década de 70, estava muito em voga o cross dressing para criar confusão de gêneros sexuais, sinalizando o nascimento de estilos de vida alternativos que estavam então começando a surgir. 

Foto: Simone Catto

As fotos de Warhol clicado por Makos são mesmo muito bonitas e expressivas. Porém, creio que eu – e provavelmente muita gente também – sinta os efeitos de uma certa ressaca de Warhol de tanto que o homem aparece na mídia. Ocorreu com o artista o mesmo que ele, intencionalmente, fez com sua obra: a massificação até a exaustão.

Sou inclusive obrigada a confessar que, embora tenha gostado das fotos, elas tornaram-se, contudo, mais interessantes depois que li o catálogo, no qual Makos conta um pouco dos bastidores, daquilo que ocorreu por trás delas. Ao citar o frenesi das viagens, o círculo de amigos, os trabalhos infindáveis e a quantidade de gente interessante que fotógrafo e modelo encontraram pelo caminho, a imaginação ganhou asas e passei a encarar essas fotos com outro olhar.

Por isso, volto novamente àquele questionamento – ou provocação - que, invariavelmente, insisto em fazer: as fotos ganharam quatro estrelas no Guia da Folha apenas porque são muito boas ou seria, sobretudo, devido à mística existente por trás delas?

Será que a exposição é considerada atraente porque o modelo é Warhol e tanto ele quanto o fotógrafo levavam uma "vida louca" e interessante? E se fossem fotos de um anônimo Zé tiradas por um talentoso, porém desconhecido Silva? Teriam elas o mesmo impacto? Em que medida interpretamos imagens não pelo que nosso olho vê, mas com base em histórias que sabemos – ou julgamos saber – existir por trás delas?

Tire suas conclusões... A exposição ‘LADY WARHOL’ está no MAM Ibirapuera – Av. Pedro Álvares Cabral, portão 3. Tel.: 5085-1300. De terça a domingo, das 10h às 17h30. Ingressos: R$ 6 (grátis aos domingos). Até 23/6.

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