sexta-feira, 11 de maio de 2012

'O Prazer', uma pequena obra-prima de Max Ophuls na Cinemateca.

Que saudades do tempo em que, criança e até mesmo já adulta, assistia a filmes antigos com minha vovó, na televisão da sala de casa! São filmes que, infelizmente, mal passam na TV a cabo hoje – e o que dizer, então, da TV aberta, que está cada vez mais deprimente?

Pois é. Quarta-feira tive o privilégio de assistir a um daqueles belíssimos filmes antigos na Cinemateca Brasileira: O Prazer, dirigido por Max Ophuls (1902-1957).  Eu já havia ouvido falar desse diretor, mas confesso não me lembrar de ter assistido a nada dele anteriormente. O Prazer é constituído de três episódios baseados em contos do francês Guy de Maupassant: A Máscara, A Casa Tellier e A Modelo. Produzido em 1952, é rodado em preto e branco, tem 97 minutos e inclui no elenco atores como Jean Gabin, Madeleine Renaud, Claude Dauphin, Danielle Darrieux e outros.

O primeiro episódio, A Máscara, conta a história de um mascarado elegantemente vestido que frequenta o Palais de la Danse, uma animadíssima casa de bailes parisiense, e acaba sofrendo um ataque. Um médico o acode e o leva para casa, onde sua leal e velha mulher, resignada, lhe conta que o marido, outrora um homem jovem, cobiçado e cheio de glórias, agora percorria os bailes noites a fio na tentativa de seduzir as jovens e recobrar a alegria de sua juventude. O uso da máscara era um patético recurso para esconder sua velhice e criar uma aura de mistério em torno das moças. A música intensa em ritmo de cancã e o travelling frenético da câmera faz com que 'mergulhemos' no baile e nos envolve de tal forma, que é quase como se estivéssemos ali, esbarrando naquelas alegres pessoas que buscam o prazer a qualquer custo. Senti-me num quadro de Toulouse-Lautrec!


O mascarado, tentando seduzir uma dançarina. Puro Lautrec!

Fiquei com vontade de sair dançando cancã ao ver essa cena! Certa vez aprendi alguns passos no balé...

O segundo e mais longo episódio, A Casa Tellier, mostra um alegre bordel que convive pacificamente com a vizinhança e é frequentado por "respeitáveis homens de bem". Lá, tudo é alegria: as moças bebem, dançam, cantam e parecem se divertir muito com os amáveis e galantes clientes, em sua maioria senhores bigodudos de meia-idade. A câmera vai passeando do lado de fora do bordel e flagra movimentos fragmentados em seu interior, para a delícia do espectador voyeur

Até que um dia o bordel aparece fechado e os homens "dão com a cara na porta", desconsolados. Tudo porque a sobrinha da "madame" do lugar, uma bela cafetina, fará sua Primeira Comunhão, e toda a trupe, contando seis moças com a "madame", dirige-se alegremente para a festa da menina numa cidadezinha do interior. Aí temos, então, o contraponto entre os prazeres mundanos de Paris e a simplicidade dos prazeres do campo, com sua natureza, seu silêncio e a pureza de sua gente. As meninas que farão a Primeira Comunhão, já grandinhas, parecem pequenas noivas, todas de branco, em seu séquito para a igreja. 

As moças assistem à missa, embevecidas, ao lado do anfitrião.

As garotas se divertem na festa da Primeira Comunhão no campo.

A alegria e a extravagância das moças da cidade encantam os habitantes do vilarejo, notadamente o anfitrião, um carpinteiro bonachão irmão da cafetina, que fica particularmente atraído por uma delas, a prostituta Rosa. A pureza da vida simples e a emoção da cerimônia na igreja local, por sua vez, comovem as cortesãs acostumadas a prazeres tão mundanos e opostos. O episódio termina com a trupe retornando a Paris e uma certeza: aqueles dois dias no campo permanecerão para sempre na memória de todos. Para as moças, porque tomaram contato com sensações tão singelas quanto inéditas. E para o bondoso carpinteiro, porque vislumbrou, como se estivesse espiando por uma fresta, relances da vida esfuziante de Paris personificada nas cortesãs.

O anfitrião bebe demais e repete dez vezes a mesma coisa... rs.

A caminho da estação de trem para o retorno das meninas a Paris, o carpinteiro para sua charrete para apanharem algumas flores. 

O último episódio, A Modelo, conta a história de uma paixão súbita – ou coup de foudre, como dizem os franceses – entre um jovem pintor e sua modelo mais jovem ainda. O casal passa a dividir o mesmo teto e, três meses depois, a relação inicial, com suas juras de amor eterno, descamba para a displicência, até chegar à frieza e à mais pura agressão, com direito a pratos e objetos voando pela casa. Até que a jovem ameaça se atirar pela janela e... algo acontece.

Aqui, o amor ainda era lindo...

E aqui, faziam juras de amor eterno, mal imaginando o que viria depois.

De todos os episódios, fica uma lição: o prazer fugaz é fácil e acessível a todos, mas a felicidade, bem... a felicidade verdadeira é algo beeeem diferente!

A exibição do filme O PRAZER faz parte de um ciclo dedicado a Max Ophuls que vai até o dia 13 de maio na Cinemateca Brasileira. Será exibido novamente nos dias 11/5 (sexta-feira), às 18h30, e 13/5 (domingo), às 20h. Consulte a programação completa, com as sinopses de todos os filmes, no site http://www.cinemateca.gov.br/A Cinemateca fica no Largo Senador Raul Cardoso, 207. Imperdível para quem gosta dos clássicos e... sente saudades da vovó. 

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