O mercado de arte norte-americano é o maior do mundo e está a anos-luz à frente do brasileiro, mas essa matéria aponta para uma tendência que, mais dia, menos dia, vai chegar aqui também: cada vez mais gente está comprando obras de arte on-line. Nos Estados Unidos, as mídias sociais e plataformas alternativas de venda de arte estão rompendo o modelo tradicional das galerias de arte no século XXI. Como as vendas de arte contemporânea atingiram a estratosfera por lá, as formas de comprar e vender obras de arte também se multiplicaram naquele país. Em outras palavras: a relação tradicional artista-galeria, na qual a galeria lentamente trabalha para desenvolver a carreira do artista, está mudando: os artistas estão interagindo com o público via mídias sociais e, muitas vezes, trocando as galerias pelos leilões.
Um, dois, três...
Em 2008, Damien Hirst fez hordas de inimigos entre os marchands
quando esnobou as galerias com as quais trabalhava (Gagosian, em Nova Yorque, e
White Cube, em Londres) e dirigiu-se à casa de leilões Sotheby's de Londres
para vender diretamente a obra Beautiful
Inside My Head Forever. "Mesmo que a venda fracasse, estarei abrindo uma
nova porta para os artistas de todos os lugares", afirmou o
artista/empreendedor aos repórteres à época. Em menos de 24 horas, 223
trabalhos foram vendidos e atingiram mais de 200 milhões de dólares, um recorde
para um leilão de um único artista. Os galeristas se prepararam para um verdadeiro
tsunami, mas, desde então, não houve outro blockbuster
como aquele nas vendas diretas em leilões. E Hirst, que havia abandonado a Gagosian
há alguns anos, retornou à galeria com grande festa na primavera deste ano.
Damien Hirst - 'Beautiful Inside My Head Forever' - 2008 |
Insta
Vendas
Artistas cujas obras alcançam preços mais realistas do que as de
Hirst estão vendendo cada vez mais nos leilões pela Internet. Apesar da retração do
mercado global de arte em 2015, o mercado de arte on-line cresceu 24% para 3,27
bilhões de dólares, de acordo com um relatório que acabou de ser divulgado pela
seguradora Hiscox, especialista nesse segmento. "Dispositivos móveis estão
se tornando nossa arma preferida", afirma Robert Read, diretor de Artes
Plásticas da Hiscox, "e as mídias sociais estão nos convencendo cada vez mais de
que 'a roupa nova do imperador' é realmente magnífica." Enquanto a maior parte
da arte vendida pela Internet custa menos de 7.250 dólares, quase um quarto das vendas
variou entre 7.250 até 72.500 dólares ou mais.
Stuart Semple e outros artistas jovens, tais como Ryan McGinley,
José Parlá e Daniel Arsham, residentes em Nova York, estão usando plataformas
de mídias sociais como o Instagram para exibir e distribuir algumas de suas
obras – e os marchands e galerias estão percebendo isso. "Estou espantado com a
quantidade de trabalhos que estamos vendendo direto do ateliê por meio do
Snapchat", diz Semple. "Antes um artista não tinha o poder de conversar
diretamente com o espectador. Creio que um artista poderia sobreviver muito bem
somente com as mídias sociais."
Instagram e Facebook são as plataformas preferidas nos Estados
Unidos, sendo que quase a metade dos compradores online usou o Instagram em
2016 por causa da arte. No ano passado, mais de 80% de todos os compradores de
arte da Geração Y compraram obras de arte on-line. Mesmo assim, diz Semple, "o
espaço físico de uma galeria ainda é importante. Tudo isso vai junto...
exposições podem ter um elemento digital e vice-versa."
Daniel Arsham - obra pertencente à Baró Galeria, São Paulo, exposta na SP-Arte 2014 - Foto: Simone Catto |
A
arte como ativo
A Artist Pension Trust,
empresa fundada em 2004 por Moti Shniberg, permite aos artistas criar um fundo
de aposentadoria usando suas próprias obras de arte como ativos. Os
participantes doam 20 obras ao longo de um período de 20 anos e, gradualmente, elas
vão sendo comercializadas: 40% dos lucros vão para o autor da obra e o restante é
dividido entre os artistas-membros e a empresa.
Com cerca de dois mil artistas e 14.000 trabalhos, a APT "oferece uma segurança financeira que as galerias não podem proporcionar", afirma
o diretor Ayal Brenner. "Nós oferecemos valor agregado e exposição global". No
ano passado, a ATP fez suas primeiras vendas, a maioria a museus, de obras com
custo médio de 30 mil dólares e uma valorização de 18% em relação a seu preço inicial no fundo.
Em março, a APT fez sua primeira distribuição de lucros. "Estamos segurando as
obras mais valiosas", diz Brenner, "até que o sistema de vendas esteja funcionando
perfeitamente". Ele não conhece concorrentes – neste ponto, diz, a APT detém o
topo do mercado. Só o tempo, porém, poderá dizer se as obras de arte trarão lucros para
os artistas e a empresa.
De tudo isso, concluímos que realmente não dá para os artistas desprezarem
a venda de obras de arte on-line, seja por meio de leilões, galerias virtuais ou
sites pessoais criados de forma inteligente e vinculados a redes sociais. Para os artistas desconhecidos, sobretudo,
a criação de um site com as ferramentas adequadas de marketing digital,
incluindo a inserção de palavras-chave e outros mecanismos que façam com que
ele seja facilmente encontrado nas buscas dos internautas, é um recurso de
vendas inteligente que não pode – e não deve – ser descartado. Ainda mais no
embrionário mercado de arte de um país como o Brasil, que, assolado por uma
crise política e econômica sem precedentes, não pode se dar ao luxo de
desprezar as ferramentas disponíveis para vender mais arte – on-line ou off-line.
O raciocínio é simples: quem aparece tem mais chances de vender. E para
aparecer, é preciso fazer bonito também na Internet.
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