domingo, 12 de julho de 2015

Mostra 'Kandinsky: tudo começa num ponto'. Quando a arte encontra o espírito.

Não pensei que seria tão tranquilo visitar a exposição ‘Kandinsky: tudo começa num ponto’, no Centro Cultural Banco do Brasil – SP, já que a mostra acaba de ser inaugurada e tem tudo para ser uma daquelas com filas que dão voltas no quarteirão. Estive no CCBB na manhã de sábado, com uma amiga que já havia reservado o horário de nossa visita em um aplicativo gratuito de celular disponibilizado pelo próprio CCBB em parceria com a Ingresso Rápido. Havia algumas filas, mas nem chegamos a ficar paradas em alguma. Entramos logo.

Foto: Simone Catto

W. Kandinsky - 'Dois Ovais' (1919) - óleo s/ tela - Museu Estatal Russo
Foto: Simone Catto

W. Kandinsky - 'Improvisação' (1913) - óleo, aquarela e guache s/ cartão - Galeria Estatal de Primorsk, Vladivostok, Rússia - Foto: Simone Catto

Segundo o idealizador da mostra, o cubano Rodolpho de Athayde, essa é a maior exposição sobre Wassily Kandinsky (1866-1944) que a América Latina possivelmente já viu. São mais de 150 obras no total, incluindo peças de artistas contemporâneos seus e de outros que o influenciaram, tais como pinturas, xilogravuras, desenhos, porcelanas, objetos do folclore russo e até objetos ritualísticos xamânicos. Não foi fácil montar a exposição. Primeiro, porque ela abrange todas as fases artísticas de Kandinsky, e também porque suas obras mais significativas estavam espalhadas por vários países da Europa. Foram necessários três anos para reunir o acervo que veio para o Brasil, com peças pertencentes ao Museu Estatal Russo de São Petersburgo, de outros nove museus também russos e de cinco coleções particulares da Alemanha, Áustria, França e Inglaterra.

W. Kandinsky - 'Igreja em Murnau, estudo' (c.1908) - óleo e têmpera s/ cartão
Museu Estatal de Artes Plásticas Mikhail Brubel - Foto: Simone Catto

W. Kandinsky - 'Murnau, paisagem estival' (1909) - óleo s/ cartão - Museu Estatal Russo
Foto: Simone Catto

Embora eu já tenha apreciado obras de Kandinsky em museus de arte moderna internacionais, ainda não estive na Rússia, e foi muito bom tomar contato com trabalhos inéditos para mim. Algumas salas do CCBB estavam bem cheias, mas nada que nos atrapalhasse. Valeu muito a pena contemplar de perto o trabalho desse que é considerado o primeiro pintor abstrato do mundo, com obras que são conhecidas por um colorido tão exuberante que chega a ofuscar a vista. Em suas pinturas abstratas, formas geométricas se entrelaçam com linhas e elementos gráficos, alguns lembrando vagamente formas conhecidas, resultando em uma explosão de cor repleta de simbologias.

W. Kandinsky - 'Improvisação 11' (1910) - óleo s/ tela - Museu Estatal Russo - Foto: Simone Catto

Foto: Simone Catto

Pintor, gravador, escritor, teórico e entalhador, Kandinsky nasceu na Rússia, mas posteriormente adotou as pátrias alemã e francesa. Começou a pintar relativamente tarde, por volta dos 30 anos, e no princípio seus temas eram figurativos, sobretudo paisagens coloridas inspiradas na arte popular russa. Em determinado momento, o artista teve contato com povos nativos da Sibéria e da Mongólia e ficou vivamente impressionado com as práticas ritualísticas e religiosas dessas populações, inclusive o xamanismo, o que muito contribuiu para que, no decorrer da vida, ele se voltasse cada vez mais para o aspecto espiritual da arte. Esse encontro entre arte e espiritualidade foi se fortalecendo gradativamente, atingindo seu ápice na pintura abstrata, na qual Kandinsky pretendeu retratar estados de alma – uma proposta que, vale notar, está muito próxima daquela dos pintores simbolistas europeus do período.

As duas obras a seguir, pintadas sobre vidro, são inspiradas em contos de fadas.

W. Kandinsky - 'Nuvem dourada' (1918) - óleo s/ vidro - Museu Estatal Russo - Foto: Simone Catto

W. Kandinsky - 'Amazona nas montanhas' (1918) - óleo s/ vidro - Museu Estatal Russo
Foto: Simone Catto

Um outro aspecto interessante da obra de Kandinsky é a associação de determinadas pinturas com sons musicais. O artista era extremamente sensível a qualquer manifestação do mundo exterior, e a música não só não escapou a seus sentidos como estava presente em algumas pinturas nas quais ele tentou expressar sons por meio de imagens. Curiosamente, essa semana mesmo li uma matéria sobre pessoas sinestésicas, isto é, aquelas nas quais os estímulos que impactam um dos cinco sentidos também impactam a um outro, como se houvesse um tipo de interferência entre os dois. No caso de Kandinsky, essa interferência se daria entre a visão e a audição, por exemplo. A esse propósito, é notória sua amizade com o revolucionário compositor austríaco Arnold Schoenberg, criador da música atonal e dodecafônica, que exerceu grande influência sobre ele. 

O fato é que a vida e a produção artística de Kandinsky são extremamente ricas e, certamente, uma exposição só não basta para conhecermos a atividade do mestre. Uma dica é comprar o catálogo da mostra, à venda na loja do CCBB por R$ 100,00. O preço é meio salgado, mas vale a pena – o livro de capa dura tem uma edição caprichadíssima, textos explicativos muito bem elaborados sobre Kandinsky e os outros artistas presentes na mostra e é ilustrado com excelentes fotos das obras expostas.

W. Kandinsky - 'Improvisação 4' (1909) - óleo s/ tela - Museu Estatal de Artes de Nyzhny Novgorod
Foto: Simone Catto

W. Kandinsky - 'Improvisação 34' (1913) - óleo s/ tela - Museu Estatal da República de Tartastan, Kazan, Rússia - Foto: Simone Catto

Você ainda não conhece o trabalho de Kandinsky? Dê um pulo no CCBB! Além de apreciar as obras do "Pai do Abstracionismo", você também vai gostar das outras pinturas expostas lá, de autoria de artistas contemporâneos do mestre. E depois, aproveite para tomar um espresso no Cafezal, a charmosa cafeteria local. O café de lá é excelente, o atendimento é bom e o pão de queijo também é uma delícia! Veja fotos do Cafezal aqui.

'KANDINSKY: TUDO COMEÇA NUM PONTO' – Centro Cultural Banco do Brasil – R. Álvares Penteado, 112 – Centro. Tel.: (11) 3113-3651/3652. Vá de metrô, que é muito mais prático - a estação São Bento é pertinho. O CCBB abre de quarta a segunda-feira, das 9h às 21h, com entrada franca. Recomendo marcar a hora de sua visita pelo site www.ingressorapido.com.br, disponível também em aplicativo para celulares.

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